São Paulo, sábado, 1 de março de 1997
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A lei do porte de armas

"O cidadão é responsável pelo aumento de crimes?"

RENATO GOMES NERY

"Ilusão pensar que o rigor da lei, por si mesmo, diminuirá a criminalidade. (...) Nenhum delinquente, antes de praticar a infração, consulta o Código Penal."
(Min. Luiz Vicente Cernichiaro - Revista Consulex nº 01, pág. 40)

Foi publicada, no dia 21/02/97, a lei do porte de armas de fogo - nº 9.437/97-, "que institui o Sistema Nacional de Armas, Sinarm, estabelece condições para o registro e para o porte de arma de fogo, define crimes e dá outras providências".
O que isso significa? As contravenções são capituladas como ilícitos penais menores, e, portanto, para elas são cominadas penas mais brandas.
Veja que a Lei das Contravenções Penais -nº 3.688 de 3/10/1941-, em seu artigo 19, estipulava "pena de 125 dias a 6 meses de prisão, ou multa, ou ambas cumulativamente" para o porte ilegal de armas.
A nova lei, que ora considera o porte ilegal de armas de fogo como crime, por consequência, prevê uma "pena de 1 a 2 anos e multa". Pena esta que será reclusão de 2 a 4 anos, se a arma for de uso restrito ou proibido.
Será que a nova capitulação do porte ilegal de armas de fogo com pena mais grave vai coibir o uso de armas de fogo ou diminuir a violência no país?
O porte ilegal de armas de fogo já era um ilícito penal e nem por isso as pessoas que usavam armas, mesmo de forma irregular ou ilegal, deixaram de fazê-lo nem a polícia teve condições de impedir o uso ilegal de armas.
Não cremos que o aumento de pena para o porte ilegal de armas de fogo venha a fazer com que as pessoas que usam armas deixem de fazê-lo, mesmo porque, a não ser para especialistas, poucas pessoas sabem a diferença entre contravenção e crime, e esta nova capitulação pouco ou nada significa para essas pessoas.
Será que o cidadão comum que cumpre com suas obrigações e que tem uma arma em casa ou que a transporta para a sua segurança é o responsável pelo aumento de crimes no país?
Um ou outro episódio isolado envolvendo pessoas comuns em crimes não justifica a nova capitulação, em que a intenção manifesta seria coibir crime pela via do endurecimento das penas. Os mesmos pretensos resultados que se pretendem com a nova lei poderiam ser obtidos com a lei antiga.
Traficantes de armas, de drogas e bandidos de uma forma geral não precisam de porte de arma. Seria, a nosso sentir, para estes que se teria que direcionar qualquer política de segurança pública no país. Não cremos que o endurecimento do sistema penal seja solução para resolver o problema da criminalidade. Certamente, servirá para aplacar a histeria da sociedade, premida pela violência que o Estado é incapaz de coibir.

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