São Paulo, quarta-feira, 5 de março de 1997
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Cineastas vampirizam Hollywood, diz Back

MÁRIO MOREIRA
DA SUCURSAL DO RIO

O cinema brasileiro deveria parar de "vampirizar Hollywood" e se concentrar na qualidade de suas obras, produzindo filmes "interessantes".
A opinião é do catarinense Sylvio Back, 59, que está montando seu nono longa-metragem, "Véu de Curityba", com lançamento previsto para o Festival de Gramado (RS), em agosto.
Para Back, os cineastas brasileiros precisam buscar novos mercados, abdicando da concorrência com os filmes norte-americanos.
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Folha - Por que você decidiu fazer um filme sobre Curitiba?
Sylvio Back - Morei 30 anos lá, de 56 a 86. Curitiba me deu régua e compasso para fazer a minha obra.
Folha - Mas por que falar da cidade só agora?
Back - Porque, vivendo lá, você não tem o distanciamento necessário. Além disso, as pessoas têm uma idéia sobre quem é o paulista, o carioca, o gaúcho, mas não se sabe como é o curitibano. Todos têm uma idéia de como é a cidade -organizada, limpa, com preocupações ecológicas-, mas não do povo. A pretensão é traçar um perfil do curitibano.
Folha - Como você faz isso?
Back - O filme é um "docudrama", um misto de documentário e ficção mostrando o presente e o passado de Curitiba. Por isso é que usei a grafia antiga do nome da cidade no título. Fiz um levantamento dos autores -poetas, escritores, compositores-, curitibanos ou não, que tivessem se debruçado sobre a cidade. A partir daí, uso poemas, diálogos, monólogos, trechos de músicas e faço um filme poético, sem narrador.
As citações são interpretadas por 18 atores, e tudo dialoga com imagens da Curitiba de outros tempos. Os atores literalmente olham para o passado. Depois desse filme, o curitibano nunca mais será o mesmo. Ele vai se descobrir.
Folha - A que conclusão o filme chega sobre o curitibano?
Back - O filme não dá uma receita de curitibano, mas eu próprio me surpreendi com algumas coisas. Comparando as imagens de hoje com as de antigamente, percebi que Curitiba mudou de cor. A cidade era eminentemente loura, branca. Hoje tem a cara do resto do Brasil, se deseuropeizou.
Folha - Quais são os seus próximos projetos?
Back - Meu próximo filme se chamará "Lost Zweig", uma ficção sobre a última semana de Stephan Zweig no Brasil, em 1942.
Folha - O cinema brasileiro vive uma fase de renascimento. O que acha desse momento?
Back - O cinema brasileiro vive de sustos. Não são ciclos. O que vejo agora é um susto positivo. Mostra que o cinema tem fôlego.
Mas, ao mesmo tempo, você vê um cinema que tenta vampirizar o que deu certo em Hollywood. As pessoas tentam ganhar o público, quando têm é que fazer filmes interessantes. Se dão ou não público, não é o mais importante.
Os cineastas estão fazendo um cinema raso. E não estão nem conquistando o público, porque ele vê uma coisa sub-americana e acaba preferindo o original. Os filmes devem refletir a nossa realidade. O cineasta brasileiro tem que voltar a ser mais cinéfilo.
Folha - Mas conquistar público não é necessário também?
Back - Sim, mas o mercado não é nosso. Tentar conquistar público é um tiro n'água. Vamos partir para outra coisa, não sei exatamente o quê. Temos que encontrar o nosso próprio mercado. Talvez as TVs a cabo possam ser uma saída.

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