São Paulo, terça-feira, 18 de março de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Agitação no mercado

CELSO PINTO

Três más notícias agitaram os mercados ontem, fazendo o dólar futuro dar um salto e a bolsa cair 2,48%: o reajuste de 0,3% no câmbio, más notícias na balança comercial e a expectativa de uma alta iminente nos juros americanos.
O reajuste de 0,3% no câmbio pegou o mercado de surpresa: faltando duas semanas, a desvalorização em março já está em 0,55%. Foi a maior taxa isolada de desvalorização desde que o Banco Central iniciou a política de pequenos ajustes por "minibandas" cambiais, há dois anos. Nos últimos meses, o BC vinha reajustando o real, em média, em 0,1% a cada vez.
Como interpretar? Nunca é demais lembrar: o BC só tem um compromisso, o de impedir que o real caia abaixo ou supere uma banda larga de flutuação. Não há qualquer compromisso do BC sobre a velocidade dos reajustes dentro da banda larga, ou mesmo sobre quando mudará a banda larga.
O BC gosta de surpreender o mercado. Quando o mercado ficou muito pessimista, no passado, o BC aplicou um reajuste menor do que a média (0,05%). Se vale a mesma lógica, talvez a razão do reajuste de ontem tenha sido jogar alguma água fria num mercado que estava ficando otimista demais.
As sucessivas indicações do BC de que não importa o déficit comercial, desde que haja financiamento externo e as reservas não caiam, levaram parte do mercado a apostar num cenário rosa. Não só não haveria aceleração na desvalorização cambial, mas poderia ocorrer o oposto: o BC reduziria um pouco o ritmo do reajuste cambial para poder continuar a reduzir os juros sem prejudicar a rentabilidade de investidores externos (que são afetados pelos reajustes).
Se a teoria está certa, o 0,3% de ontem teria sido o equivalente tropical à advertência recente do presidente do banco central norte-americano (Fed), Alan Greenspan, quando disse que havia uma "exuberância irracional" no mercado de ações americano. Lá, bastou a fala de Greenspan para os investidores colocarem as barbas de molho.
Aqui precisou mais do que palavras, mas o efeito foi pesado. No mercado futuro de julho (válido para junho), o mais negociado, a cotação do real frente ao dólar pulou de R$ 1,0797 na sexta para R$ 1,0809 ontem. O reajuste embutido em julho ficou em 0,73%.
A segunda má notícia foi a expectativa crescente de um aumento nos juros americanos na reunião do Comitê de Mercado Aberto no próximo dia 25. Uma pesquisa entre 35 instituições financeiras americanas revelou que apenas 7 acham que os juros não vão mudar.
Um único banco, o Citibank de Nova York, aposta que os juros americanos vão cair neste ano. No ano passado, o economista do Citi, o indiano Ram Bagavathula, também foi na contramão do mercado e acertou.
Se o aumento dos juros americanos ficar, no máximo, em 0,5% a curto prazo e abaixo de 1% no ano, o mercado imagina que será absorvido sem muito sobressalto. No entanto, muito banco de peso, como o Morgan Stanley e o Goldman Sachs, acha que os juros básicos podem pular de 5,25% hoje para 6,5% no final do ano.
Se o aumento dos juros americanos atrair investidores internacionais, o fluxo de capitais para países emergentes, como o Brasil, pode ser afetado. Em reação, seria previsível esperar um aumento dos juros no Brasil. O cenário não é de crise, mas as incertezas aumentaram.
A terceira má notícia circulou extra-oficialmente. Os resultados da segunda semana da balança comercial foram decepcionantes: o déficit acumulado já teria chegado a US$ 470 milhões, um total que alguns imaginavam para todo o mês. A média de exportações por dia útil teria caído de US$ 192 milhões na primeira semana para US$ 170 milhões, enquanto as importações teriam subido de US$ 219 milhões para US$ 239 milhões.
Mesmo que a média das exportações suba para US$ 200 milhões nas duas semanas restantes e as importações mantenham a média, a expectativa do déficit comercial em março sobe para algo em torno de US$ 750 milhões. Mais do que se imaginava e certamente muito alto para esta época do ano.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

Texto Anterior: Coordenadoria deve mudar
Próximo Texto: Documento de fiscal do BC 'aprova' Vetor
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.