São Paulo, quinta-feira, 20 de março de 1997
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África discrimina mulher com Aids

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Mulheres africanas com Aids compõem hoje o retrato mais dramático e cruel da epidemia. São vistas como uma ameaça, não como vítimas. Em Uganda, como em muitos países da África Negra, os homens se recusam a fazer testes e não informam suas mulheres quando estão contaminados.
Oficialmente, há seis mulheres ugandenses infectadas ou doentes para cada homem. Quase todas pegaram a doença em relações sexuais com seus maridos.
Quando um homem morre de Aids, a mulher perde as propriedades e até os filhos para a família do marido. As viúvas infectadas, que tentam se casar novamente, são chamadas de "assassinas de homens".
Ao contrário, se é a mulher que morre primeiro, a família do viúvo providencia rapidamente outra "mulher". Essa mulher também acabará infectada, porque no casamento poucos homens aceitam usar preservativo.
Este cenário difícil de ser imaginado foi relatado por Beatrice Were no 8º Encontro Internacional Mulher e Saúde que termina hoje no Rio. Beatrice, 28, assistente social, coordena uma rede de comunidades de mulheres com Aids em Uganda e representa o movimento em toda a África. Ela é portadora do HIV e perdeu o marido com Aids há seis anos. Tem dois filhos, mas não sabe se estão infectados.
Segundo Beatrice, Uganda tem oficialmente 1,5 milhão de soropositivos e doentes de Aids entre seus 18 milhões de habitantes. Comparado com o Brasil, onde haveria perto de 500 mil portadores e doentes, a incidência em Uganda é 30 vezes maior.
Beatrice acredita que em seu país o número deva ser muito maior, pois só há um centro de testes no país -na capital Kampala.
As mulheres aparecem em número tão maior porque muitas passam por exames quando ficam grávidas. Identificadas como infectadas, as mulheres são discriminadas, isoladas e vistas como culpadas no meio em que vivem.
As redes de mulheres com Aids foram criadas para tentar reverter essa situação.
"Nós, que temos HIV, somos as únicas que podemos barrar o crescimento da epidemia", diz Beatrice. "Se convencermos os homens a usar preservativo, os casos diminuirão", diz.
"Fomos contaminadas em relações consideradas normais pela sociedade. Não devemos nos sentir culpadas ou envergonhadas."
(AB)

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