São Paulo, sábado, 22 de março de 1997
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Obra expõe Paris como mito romântico

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

"Não se trata tanto do que Paris dá a você, mas do que Paris não tira." A frase, da escritora Gertrude Stein, é o mistério que o professor norte-americano Christopher Sawyer-Lauçanno tenta resolver no livro "Escritores Americanos em Paris", lançado pela editora José Olympio.
Durante 13 capítulos acompanhamos o segundo grande momento de exílio para literatura dos EUA. O período iniciado no fim da Segunda Guerra e que durou, segundo o autor, até 1960.
O trabalho é um estudo sobre as motivações e angústias que levaram mais uma geração de romancistas e poetas a transformarem a capital em um refúgio.
Depois de Ernest Hemingway e F. Scott Fitzgerald, entre tantos nos 20 e 30, os anos 50 e 60 foram o período dos romancistas negros, como James Baldwin, ou da geração beat dos poetas Allen Ginsberg e Gregory Corso.
Baseado em obras de ficção, testemunhos, cartas e diários, "Escritores Americanos" se inicia com um dos últimos -e gloriosos- suspiros da velha guarda: a libertação de Paris do domínio alemão, em agosto de 1944.
Hemingway, trabalhando como correspondente, decide participar da tomada do lugar. Apesar de não poder portar armas, consegue uma, sobe em um jipe e segue para "a cidade que mais amo".
A tese de Sawyer-Lauçanno é de que a nova aventura intelectual, e territorial, de jovens que sonhavam com bulevares e romances se inicia nesse momento.
Hemingway não chega, mas retorna. E no papel de um ídolo estabelecido, conhecedor dos melhores quartos de hotel e mulheres.
Mas, ao seu lado, vinham também os soldados rasos, tanto metaforicamente quanto de fato. Jovens que deixavam pela primeira vez as cidades provincianas onde tinham nascido.
Assombro
No levantamento feito por Sawyer-Lauçanno, professor de literatura e estudos humanistas do MIT (Massachusetts Institute of Technology), aparecem então Irwin Shaw ou J.D. Salinger -o celebrado autor de "O Apanhador no Campo de Centeio"- em cargos burocráticos nas tropas.
O encontro com Paris, e a cultura francesa, foi para muitos uma experiência quase religiosa, evidenciada tanto no assombro pela beleza da cidade quanto em uma nova forma de ver e compreender as próprias ambições literárias.
"O artista desfruta certa dignidade aqui. Predomina um sentimento em Paris que divulga a arte em qualquer de suas formas... Em Nova York, mesmo um escritor de sucesso escreve a sério. Sempre se tem o sentimento de estar um pouco na periferia de tudo", escreve o romancista James Jones.
Passado o momento em que só o fato de serem americanos já os qualificava de heróis, chega o instante do racionamento de comida e da pobreza, que, mesmo em Paris, continua sendo um acontecimento deprimente.
Muitos voltam, outros persistem. A euforia termina, mas ficcionistas norte-americanos continuam a ser tomados -e vitimados- pelo mito fantasioso.
E, para os escritores negros como Richard Wright ou Chester Himes, a crença romântica fez com que esperassem dos franceses a recusa da idéia de racismo.
Sawyer-Lauçanno prossegue em seu estudo mostrando de que maneira os norte-americanos criam uma subcultura na França, com a criação de revistas literárias para imigrados, como a "Paris Review", até o momento em que o romancista William Burroughs abandona o hotel Beat, em 1959.
O que Paris não tira, pensa o autor, é que faz de um americano um homem mais livre.
(MR)

Livro: Escritores Americanos em Paris
Autor: Christopher Sawyer-Lauçanno
Lançamento: José Olympio
Quanto: não definido (371 págs.)

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