São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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Abujamra explode a hipocrisia

NELSON DE SÁ
DO ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Marco Antonio Braz, o "novo diretor" de "Viúva, porém Honesta", teria uma ou duas coisas a aprender com o "veterano" Antônio Abujamra, de "O Casamento".
O espetáculo fez estréia nacional anteontem em Curitiba, com 25 atores no palco, como uma comédia que não deixa palavra, não deixa expressão de Nelson Rodrigues sem a devida atenção em cena, sem o devido sublinhar de sarcasmo.
É Nelson Rodrigues, o comediógrafo, mais do que nunca, mais do que em qualquer das montagens recentes, uma delas do mesmo Abujamra, "A Serpente", que procuraram recuperar. Para tanto, o diretor não se conteve, não buscou dar o correto desenho, não respeitou; soltou o texto livremente pelo palco.
É uma adaptação, não um texto original para teatro, o que talvez tenha facilitado na revelação do humor e também na ausência de travas com que os atores lidaram com os personagens rodriguianos.
Não há trama definida, embora se possa descrever que a montagem corre em torno das revelações sobre uma família e agregados vários, nas vésperas do casamento de Glorinha, a filha aparentemente ingênua, mas desregrada de um dr. Sabino Uchôa Maranhão, autodefinido "homem de bem".
Todas as obsessões rodriguianas estão em cena, em torno de Glorinha, do pai incestuoso ao noivo "pederasta". Todos somos leprosos, diz a montagem à platéia, em referência aberta de que os personagens não são exceção; de que, não fosse a culpa, estariam todos de quatro no mato.
Mas muito poderão dizer que um certo intuito moral em Nelson Rodrigues se perdeu em Antônio Abujamra, ou que muito mais se perdeu, caso da busca do equilíbrio entre o cômico e o trágico.
Mas trata-se de uma montagem de Abujamra, cujo humor talvez não consiga trabalhar com as "one-liners" rodriguianas de outra maneira. É um espetáculo bem acabado, apesar da liberdade ou da libertinagem da companhia que leva o adequado nome "Os Fodidos... Privilegiados". A interpretação é desenhada ao limite dos gestos, do andar.
Mas é uma festa, não de casamento, mas de explosão dele, talvez mais do que propriamente uma peça.
(NS)

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