São Paulo, terça-feira, 25 de março de 1997
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Lucro extra na energia

CELSO PINTO

Não é por acaso que a privatização de distribuidoras de energia elétrica no Brasil tem atraído tanta atenção internacional. As margens de lucro dessas empresas estão num pico histórico, e, pelas regras já adotadas, os novos donos poderão assegurar essas margens por pelo menos oito anos.
São Paulo é um caso extremo, diz o presidente da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), Andrea Matarazzo, mas não a exceção. No final do ano passado, a tarifa média de geração em São Paulo estava em US$ 34,13 por Megawatt-hora, enquanto a tarifa na distribuição chegou a US$ 77,79. Sobraram nas mãos das distribuidoras US$ 43,66 por MW-hora, mais do que toda a tarifa de geração. A diferença entre o valor pago pelas distribuidoras pela energia e o de venda aos consumidores representou 56% do valor final. Entre 88 e 93, essa margem ficou, em média, em 30,5%, quase a metade do ano passado. Em 94 e 95, ela ficou em 48%.
O caso da Cesp é extremo porque, na vigência do Plano Real, enquanto outras geradoras levaram 33% de aumento de tarifas, a Cesp levou apenas 19%. A tarifa de US$ 34,13 por MW-hora do ano passado se compara com US$ 47,38 em 92 e um pico de US$ 52,11 em 88.
Como no sistema estatal o dono das geradoras e das distribuidoras é o mesmo, a diferença de margens afeta apenas a distribuição dos lucros entre as várias empresas. Da energia gerada pela Cesp, apenas 5% fica com distribuidoras privadas. O resto é dividido entre empresas da Cesp, a CPFL e a Eletropaulo. As belas margens explicam porque a CPFL deu lucro no ano passado, depois do prejuízo de 95.
A privatização, contudo, muda inteiramente a questão. O próprio Matarazzo lembra que, se for mantida essa estrutura de tarifas, quem ficar com as distribuidoras ficará com uma margem extraordinária. Uma avaliação, diz ele, que vale também para as outras distribuidoras do país.
Até agora, três empresas de distribuição de energia foram privatizadas: a Light, a Escelsa e a Cerj. Nos três casos, acabou se aplicando a mesma regra para as tarifas futuras, o sistema de "price cap". Ele prevê a rediscussão periódica das tarifas. A idéia é que na rediscussão os ganhos de produtividade obtidos se revertam em tarifas menores no período subsequente. Só que, na falta de um quadro regulatório mais sólido para o setor, o BNDES acabou oferecendo um período inicial de oito anos em que a distribuidora poderá repassar para sua tarifa virtualmente toda variação de custo na compra de energia. Ou seja, garantiu a margem de lucro atual.
Dado o precedente, difícil mente São Paulo poderá fugir desse sistema. Mas, se o fizer, estará preservando uma margem enorme para a distribuição. Matarazzo defende um aumento nas tarifas da geração que seja absorvido pelas distribuidoras, e não repassado para os consumidores, como uma forma de mudar as margens.
Se tudo der certo, São Paulo vai privatizar em agosto a distribuidora CPFL (controlada em 68% pela Cesp), que vale R$ 3 bilhões no mercado acionário. As três usinas de geração do Pardo seriam vendidas até o final do ano. No entanto, isso supõe que o governo federal já teria, até lá, definido algumas regras básicas para a geração. Caso contrário, a venda das geradoras poderá ser postergada e antecipada a venda das distribuidoras da Cesp.
O sistema energético paulista está pronto para a venda. A Cesp divulgará seu resultado de 96 amanhã. No mercado, estima-se que o resultado operacional tenha mais do que dobrado em relação ao de 95. A capacidade de geração de caixa, que havia crescido 29% no ano encerrado em setembro (para R$ 881 milhões), melhorou ainda mais.
Medido pelo sistema de correção integral de balanço, a Cesp fechou 96 com lucro, embora tenha fechado no vermelho pelo critério da legislação societária. A Cesp reduziu de 19,7 mil em 94 para 11,1 mil no ano passado o número de funcionários, melhorou os índices de qualidade e reestruturou-se.
Há dois anos, muitos achavam o modelo paulista de privatização do setor complexo e lento. Hoje, contudo, São Paulo está pronto. O que faltam são algumas regras básicas do governo federal.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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