São Paulo, terça-feira, 25 de março de 1997
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Pragmatismo e "profissionalismo"

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
EM WASHINGTON

Aos 29 anos de idade, Walter Clark Bueno assumiu a direção-geral da TV Globo do Rio. Dois anos depois, tornou-se o principal executivo da Rede Globo, que ele em grande parte ajudara a conceber. De 1967 a 1977, foi o mais poderoso executivo da história da comunicação social do Brasil.
O sucesso da Globo se deve em muito à visão que Clark trouxe para a emissora: a de que a programação é um produto que tem que ser vendido como outro qualquer.
A orientação de "marketing" que Clark deu à Globo era inédita. A partir dela, nem a TV nem qualquer outro meio de comunicação pôde ignorar a sua condição de objeto de consumo com a finalidade de gerar lucros. A fase artística, romântica, ingênua, acabou com o êxito sem precedentes da Globo.
Walter Clark era o componente mais visível de uma equipe que liderou o processo de consolidação da Globo como o mais importante instrumento da indústria cultural brasileira. Joseph Wallach, José Bonifácio de Oliveira, o Boni, José Ulisses Arce, José Otávio Castro Neves, Armando Nogueira, Borjalo eram outros integrantes. Todos tinham como princípio doutrinário o que depois se tornou conhecido como "profissionalismo" -estabelecimento de metas claras a serem alcançadas e mobilização de recursos para atingi-las.
A integração entre programação, publicidade e gerenciamento era essencial para que isso funcionasse. O compromisso único de Clark era com o maior número possível de pontos no Ibope.
Como era necessário usar Jacinto Figueira Júnior, Raul Longras, Dercy Gonçalves para obter a audiência do público-alvo do seu período inicial de Globo, foi o que ele mobilizou.
Classe média
Quando uma classe média se estabeleceu como o grupo social que ditava o gosto nacional, o "padrão Globo de qualidade" se elevou (pelo menos na aparência) para atendê-lo. Quando a doutrina ideológica do regime militar era aceita e a submissão aos seus interesses foi essencial para assegurar o crescimento da rede, Clark a aceitou com vigor.
Quando a abertura política começava a parecer inevitável, ele a acompanhou com limitadas ousadias (como a novela "O Bem Amado").
Embora seja difícil saber a quem creditar com precisão a autoria de idéias num trabalho coletivo como a televisão, foi no período em que Clark esteve à frente da Globo, que o conceito da telenovela como "âncora" de toda a programação da rede se estabeleceu.
Clark foi também o defensor da teoria de que a audiência de um programa atrai a dos seguintes.
A importância de Clark na história da TV brasileira nunca poderá ser subestimada. Mas é evidente que o seu êxito foi o resultado não só de sua inteligência e pragmatismo como de uma conjunção de circunstâncias.
Como ele mesmo definiu, Roberto Marinho o chamou num momento de desespero ("o sujeito quando está desesperado faz qualquer negócio, vai ao Zé Arigó, à macumba; eu fui o Zé Arigó do dr. Roberto Marinho").
A situação política, econômica e social do país era adequada à sua filosofia. As pessoas que trabalharam com ele estavam disponíveis. Pela Bandeirantes, nos 80, sua passagem foi inexpressiva.

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