São Paulo, sexta-feira, 28 de março de 1997
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Wagner Ramos tratava com Maluf

LUÍS NASSIF

Wagner Ramos, o cérebro do esquema dos precatórios, se vangloriava de despachar diretamente com o prefeito de São Paulo, Paulo Maluf --e não com o Secretário das Finanças, Celso Pitta--, em assuntos referentes à questão dos precatórios. O próprio Maluf pagou transplante de rim de Ramos e colocou à sua disposição um jatinho, quando morreu seu (de Ramos) irmão, fora do estado de São Paulo.
Além disso, Ramos atribuiu ao senador Gilberto Miranda papel relevante na aprovação dos precatórios, elogiando a maneira habilidosa como conseguiu a aprovação do Senado.
Essas informações foram prestadas por Fábio Nahoum, do Banco Vetor, a dois senadores da CPI --Roberto Requião e José Serra-- em encontro sigiloso ocorrido antes de ontem no apartamento do irmão de Requião.
O encontro foi presenciado pelo colunista e pela repórter Mônica Bérgamo, da TV Bandeirantes.
Antes de se começar a conversa, a partir das condições propostas por Nahoum, todas as partes concordaram que as informações não seriam divulgadas. Serviriam para preservar a testemunha e orientar as investigações da CPI e as jornalísticas, permitindo encaixar as peças que faltam no quebra-cabeças.
Os jornalistas mantiveram sua palavra. O Senado, não, denotando que a questão ética é problema que atinge todos os setores da vida nacional. O vazamento foi providenciado pelo senador Vilson Kleinubing, de Santa Catarina, que não foi aceito ao encontro, ao jornal "O Globo" --de maneira incorreta e parcial--, a partir de relato de Requião.
Constatando que o vazamento sobre o restante da conversa era inevitável, ambos os jornalistas decidimos divulgar a versão correta do episódio.
Duas vertentes
Nahoum divide a questão dos precatórios em duas vertentes distintas. A primeira, é a tecnologia de conseguir aumentar o valor dos precatórios e obter a aprovação do Senado e do Banco Central. A segunda, a operação dos títulos no mercado financeiro.
A tecnologia dos precatórios era da prefeitura de São Paulo, de Wagner, que operava tratando diretamente com Maluf.
Nahoum foi alertado para ela quando sua mesa de operações lhe informou que apenas o município de São Paulo continuava colocando títulos no mercado, enquanto outros estados e prefeituras não conseguiam.
A partir desse dado, ele foi atrás de Wagner, que lhe contou da tentativa de levar a tecnologia para Alagoas, que fracassou justamente na segunda etapa: a colocação de títulos no mercado. Como --segundo Nahoum-- Wagner não tinha nem conhecimento nem envergadura para levar a operação para outros Estados, aceitou a parceria com o Vetor.
A primeira operação foi acertada com Pernambuco.
Nas negociações, Nahoum preocupou-se com a possibilidade de perder tempo e dinheiro preparando a operação, e ela não ser aprovada no Senado. Segundo Nahoum, a reposta de Wagner foi: "Fique tranquilo, porque virou jurisprudência firmada". Nahoum indagou como tinham conseguido. E Wagner: "O relator Gilberto Miranda foi muito hábil".
Segundo Nahoum, o esquema político da prefeitura lucrava duas vezes. Uma, através do pagamento da comissão. A segunda --aí já é suposição sua-- a partir de negociações com empreiteiras, já que o dinheiro arrecadado nas operações com outras prefeituras paulistas quase invariavelmente iam para pagar empreiteiras --e não precatórios.
Negociação financeira
A segunda parte do jogo era a negociação dos títulos no mercado financeiro --sob sua responsabilidade.
Nahoum diz que nessa etapa a prefeitura não tinha participação, nem ele. Diz que se limitava a fazer a primeira venda no mercado. Na conversa, tentou passar a responsabilidade pela montagem da "cadeia" de intermediários ao Bradesco e ao Banestado --maiores compradores de títulos.
Mas usou de dedução, não de informações. Ao contrário do que informou "O Globo" --a partir da versão de segunda mão do senador Kleinubing--, Nahoum jamais declarou ser "laranja" do Bradesco, ou mesmo dispor de informações sobre o caso. Montou essa linha de defesa a partir de deduções.
Foi-lhe lembrado o fato de as negociações começarem pelo Vetor e terem no caminho, como doleiro, o Split e como laranja o IBF --ligadas aos esquemas de arrecadação de campanha de Maluf desde o episódio Paubrasil. Nahoum garantiu ser mera coincidência.
Obviamente, essa tese faz parte de sua linha de defesa e terá que ser comprovada a partir do rastreamento das operações dos doleiros.
Caixinhas políticas
Durante a conversa, senadores e Nahoum chegaram à conclusão de que nesse esquema acabaram confluindo outras caixinhas políticas estaduais. Duas peças-chave seriam Fausto Solano Pereira, da corretora Boa Safra, e Mário Celso Petraglia, da Inepar, de Curitiba.

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