São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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Quero jogar pelo Brasil

BETINA BERNARDES
ENVIADA ESPECIAL A MÔNACO

Já existe um jogador na Europa muito bem cotado para a Copa do Mundo de 98. No país que vai ser a sede dos jogos, ele já é considerado rei e conta ainda com o título de artilheiro do campeonato de 96, que jogou pelo Mônaco.
O problema é que Sony Anderson não é francês, nem norte-americano -como se poderia julgar pelo nome. Anderson da Silva, 26, é brasileiro, nascido em Goiatuba, interior de Goiás, e não caiu nas graças de Mario Jorge Lobo Zagallo, o técnico da equipe de futebol do Brasil, único país pelo qual poderia jogar na Copa do Mundo.
Quem conhece bem a história de Anderson pode jurar que se trata de um jogador de muita sorte -ou puro azar, depende do ponto de vista.
O futebol
A ligação de Anderson com o futebol vem do berço. Seu pai, Da Silva, foi técnico de vários times nas cidades de Goiatuba, Guaíra (SP), Uberaba (MG) e Jaú (SP), onde ainda vive.
"Comecei a jogar bola com oito anos, mas em clube comecei aos 14, em Jaú", conta Anderson.
Nessa época, os treinamentos e os jogos acabaram levando-o a abandonar a escola na 8ª série. "Eu sempre fugia das aulas para ir às peladas. Depois que entrei no clube, resolvi largar de vez", diz.
A primeira experiência como jogador profissional foi no Vasco, em 1988, quando tinha 18 anos.
Aí a primeira sorte -ou azar: o técnico do Vasco era Zagallo, que o colocou como ponta direita da equipe.
"Zagallo chegou no Vasco quando eu estava no meu segundo ano no clube. Ele me colocou como ponta direita achando que eu fosse um novo Jairzinho, ele falava isso para todo mundo", conta.
Ótimo para um garoto de 19 anos. Só que, aos 26, Anderson conserva com Zagallo a mesma imagem que tinha aos 19. Quando indagado se vai escalar Anderson ou ver algum jogo dele, o técnico da equipe brasileira costuma dizer que já o conhece dos tempos do Vasco e encerra o assunto. Nem mesmo os técnicos de futebol europeus ou veteranos como o jogador francês Platini conseguem entender.
"Eu era novo e sei que cresci nesses sete anos, ele não pode comparar o Anderson de 19 anos com o Anderson de hoje", lamenta-se.
Europa
Anderson foi parar na Europa meio por acaso. Em 92, depois de passar três anos jogando como profissional do Vasco, ele foi para o Guarani. Na época, o clube suíço Servette estava interessado no jogador Evair. "Ele disse que não queria mais voltar para a Europa, aí o empresário disse ao Servette que tinha um outro atacante, que era eu", conta.
"Quando cheguei à Suíça, ninguém sabia quem eu era", diz.
Anderson fez um teste e foi aprovado. Contratado, foi o artilheiro logo no primeiro campeonato que disputou. A torcida, entusiasmada, gritava seu nome, que, no francês, ganha ênfase na última sílaba. De "Andersôn", passou para apenas "Sôn" e, finalmente, Sony.
Após um ano e meio no Servette e já falando razoavelmente francês, Sony passou para o OM (Olympique de Marseille), na França, onde ficou seis meses. Em 20 jogos, marcou 16 gols. Em maio de 94, foi comprado pelo Mônaco.
Foi então o artilheiro do campeonato francês de 96 e levou seu time a ser vice-campeão. Neste ano, o Mônaco está na liderança do campeonato, e Anderson é mais uma vez o responsável, sendo, até agora, o terceiro jogador com maior número de gols.
História comum entre os jogadores brasileiros na Europa, fazer gols significa diretamente mais dinheiro, mais luxo, valor do passe aumentado e disputa entre os outros times que querem ter o jogador.
Ele já foi sondado por vários times italianos e espanhóis e seu passe vale hoje no mínimo US$ 14 milhões, mas seu contrato com o Mônaco vai até o 2001.
Como estrela do futebol francês, ele dirige uma Mercedes-Benz e mora numa casa de três quartos.
Só que Anderson quer mais. Quer participar da Copa do Mundo. Há boatos de que já houve uma tentativa por parte da equipe francesa de fazê-lo adotar a nacionalidade francesa para poder jogar pela seleção daquele país.
Anderson desmente: "Nem passou pela minha cabeça ser naturalizado francês".
"Uma vez que um jogador já atuou oficialmente na seleção de seu país, ele não pode mudar de seleção, e eu já joguei na seleção brasileira de júniores", afirma.
Além disso, Anderson diz que não vê "mérito" em jogar por outra equipe que não seja a brasileira.
"No Brasil, é difícil jogar na seleção. Aqui na Europa, vários treinadores já me falaram que, se eu não fosse brasileiro, jogaria fácil na equipe deles, e elas seriam campeãs. Em todos os países sei que hoje jogaria pela seleção. É difícil para mim, porque é só o treinador da seleção brasileira que não vê. Só depende do Zagallo."

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