São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 1997 |
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"Foi coisa do Francis"
CARLOS HEITOR CONY Rio de Janeiro - Uma imagem vale 10 mil palavras. Nunca acreditei muito nesse axioma da moderna comunicação visual, pelo menos até o último sábado, quando vi a impressionante foto do poeta Ferreira Gullar -meu fraterno amigo- na capa do segundo caderno de "O Globo", ilustrando violenta esculhambação em cima de mim.Era uma foto em cor, se fosse em preto e branco seria um monumento ao expressionismo. Logo na primeira frase do artigo ele se declara "perplexo", e 10 mil palavras não traduziriam a perplexidade de sua imagem, num corte vertical de seu perfil gótico-maranhense. Ele respondia a uma resposta minha, quando acusei o Comitê Cultural do finado PCB de exercer um patrulhamento na área artística e cultural. Privilégio que não foi exclusividade do PCB, pois o PCUS (Partido Comunista da União Soviética) deu o exemplo e a ordem para que os partidos-irmãos fizessem o mesmo. Dos expurgos de Stálin (o caso Trótski foi o mais notável) ao Gulag que condenava escritores, artistas e cientistas ao ostracismo (casos Pasternak, Soljenítsin, Sakharov), o patrulhamento foi feroz e anunciava que o socialismo na versão comunista não iria dar certo. Até o Gullar deve reconhecer isso -embora tardiamente. Cacá Diegues falou em patrulhas ideológicas depois de 1967 -nisso Gullar tem razão-, mas o fato de o batismo ter sido posterior revela apenas que a criança nasceu antes. Escrevi um romance naquele ano. O Paulo Francis, entre outros, me alertou que o partidão me condenaria a morrer de fome. Passaram-se 30 anos, fiquei um tempão em obsequioso silêncio, mas não morri de fome, até que sobrevivi bem. Nos últimos tempos, ando até com um excesso de 5 kg no peso. Como disse o Leandro Konder na mesma matéria, "foi coisa do Francis". Poderia dizer que foi também coisa do Otto Maria Carpeaux e outros. Esses 30 anos -acho eu- deram razão a eles. Texto Anterior: Candidato atrapalha Próximo Texto: Justiça competitiva Índice |
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