São Paulo, quarta-feira, 2 de abril de 1997
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Vieira diz que BC vendeu barato a marca

SHIRLEY EMERICK
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O senador José Eduardo de Andrade Viera (PTB-PR), ex-dono do Bamerindus, disse que o preço fixado na venda da instituição foi muito baixo.
Os advogados contratados por ele estudam a possibilidade de entrar com uma ação contra o Banco Central por causa dos R$ 400 milhões pagos pelo Hongkong and Shanghai Banking Corporation pela marca Bamerindus.
Em entrevista à Folha, Andrade Vieira criticou o BC pela demora na definição da negociação e disse que mantém seu apoio ao governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.
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Folha - A venda da marca do banco por R$ 400 milhões é barata?
José Eduardo de Andrade Vieira - Me parece um valor pequeno em relação ao que o Bamerindus representa no sistema financeiro nacional. É uma rede de 1.200 agências. As pesquisas, feitas no ano passado, mostram o alto grau de satisfação da clientela com a qualidade dos serviços e ausência de filas.
Pela experiência que tenho no mercado bancário brasileiro, diria que o 'good will' é de R$ 1 bilhão para cima. Qualquer coisa menos do que isso é prejuízo para os acionistas do Bamerindus.
Folha - Com base nesse cálculo, que o sr. considera baixo, é possível acionar o Banco Central na Justiça?
Andrade Vieira - É isso que os advogados estão estudando. Se puder provar que um bem tem um valor X e foi vendido por um valor muito inferior, haverá um processo, sem dúvida nenhuma.
Folha - A ação iria ser motivada então por causa dos valores?
Andrade Vieira - O BC, por lei, tem a prerrogativa de intervir no sistema bancário, seja por meio do Raet (Regime de Administração Especial Temporário) ou da intervenção direta, como fez no caso do Bamerindus.
Isso não se discute. Vão ser discutidos os valores da venda do patrimônio do Bamerindus, a marca e o potencial de ganho que a empresa oferece.
Folha - Qual era o problema do Bamerindus?
Andrade Vieira - Havia três problemas. A posse dos títulos podres, que, na sua maioria, não foram ações realizadas pelo Bamerindus e sim consequência de decisões do governo federal.
Havia também as perdas com empréstimos agrícolas neste governo e outros empréstimos industriais, com taxas de juros altas para garantir a estabilidade do Real.
E a Inpacel (fábrica de celulose) não é má gestão nem projeto errado. Ela sofreu seu primeiro impacto financeiro no Plano Collor e o segundo no Plano Real.
Folha - Uma das críticas feitas pelo BC ao Bamerindus é a relação do banco com as empresas do grupo.
Andrade Vieira - O Bamerindus não tinha nenhuma negociação inter-relacionada. Ele financiava a Inpacel no mercado. Quando começou a boataria -e o BC não fez nada para impedir a boataria, que era obrigação dele-, o grupo Bamerindus começou a perder crédito no sistema bancário nacional e internacional e isso obrigou então o carregamento das debêntures. Ele era feito no mercado e passou a ser feito pelo Bamerindus.
Folha - O BC poderia ter feito alguma coisa em relação aos boatos?
Andrade Vieira - Sem dúvida, podia. Era função dele, obrigação dele. Ele foi totalmente omisso.
Folha - Mas por que a demora?
Andrade Vieira - No início, acreditei que seria encontrada uma solução. Hoje, o que vejo é que o BC, desde o início, estava preocupado em me responsabilizar pelo fracasso do Bamerindus. Ele, em nenhum momento, levou em consideração que me afastei do banco em abril de 90. E quando deixei o banco a situação era ótima.
Folha - Mas não há aí uma responsabilidade do banco também?
Andrade Vieira - É claro que acho que todo administrador é responsável pelo resultado da empresa, mas não posso culpar a administração, tendo consciência, como eu tenho, de que metade do Brasil quebrou no Plano Real.
Folha - No primeiro momento, o Bamerindus convidou o HSBC para participar das negociações. O que aconteceu?
Andrade Vieira - Depois de várias reuniões, eles descartaram qualquer possibilidade no sentido de comprar o banco. Depois de um ano, eles compraram tudo, numa operação totalmente sigilosa, que não vazou nada no mercado. Enquanto isso, todas as tratativas que tentávamos com o BC vazavam no dia seguinte.
Folha - O sr. achou que eles iriam fazer uma intervenção depois de toda essa negociação?
Andrade Vieira - Só passei a imaginar essa possibilidade na última semana, quando os boatos ficaram muito fortes. Até a terça-feira da Semana Santa, não imaginava que pudesse haver uma intervenção. Se (o BC) ia fazer isso, podia ter feito há um ano, quando a perda patrimonial não era tão grande.
Folha - O BC deve criar ainda hoje a comissão de inquérito para apurar as causas que levaram à intervenção. O que o sr. acha que essa comissão pode concluir?
Andrade Vieira - Pode ter havido um empréstimo malfeito nessas perdas da agricultura. Obviamente, como o banco é muito grande, com grande número de operações, acharia até impossível não encontrar uma operação malfeita. Mas ele vai encontrar que a Inpacel teve um custo financeiro elevadíssimo em função dos planos Collor e Real, e a perda patrimonial dos títulos públicos, cuja responsabilidade não é minha, é de ex-ministros da Fazenda e do atual.
Folha - Como fica o seu apoio ao governo federal?
Andrade Vieira - Apoiei o presidente Fernando Henrique Cardoso porque acreditava que ele conseguiria mudar o cenário brasileiro, e isso está acontecendo. Então não há por que mudar de opinião ou de posição.

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