São Paulo, quinta-feira, 10 de abril de 1997
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'Quanta' faz ponte entre ciência e arte

LUIZ ANTÔNIO RYFF
DA REPORTAGEM LOCAL

O "engenheiro musical" Gilberto Gil constrói uma ponte unindo ciência e arte, modernidade e tradição em seu novo disco, o CD duplo "Quanta".
Para o cantor, "Quanta" é seu disco mais conceitual. "Pelo menos é o que me deu mais trabalho, levou mais tempo e me trouxe mais dúvidas", disse ele, em entrevista à Folha. O cantor mostrará "Quanta" no Palace, entre hoje e domingo.
No disco, Gil elabora "uma leitura poética sobre a ciência e sobre suas interfaces com a filosofia, a religião e a arte", como define o compositor.
Em "Quanta", ele fala de fractais, Internet, hackers, quarks etc. Ao mesmo tempo, trata de filosofia chinesa e candomblé.
Seu objetivo é criar "pontes entre o campo mágico e o campo da física", algo que, segundo ele, retrata uma aproximação que já acontece entre a ciência e o misticismo, como a ufologia.
No CD, Gil afirma sua vocação para construtor de pontes. "Desde o tropicalismo a idéia era essa, pontes em universos contínuos. Criei esse hábito. É por isso que eu digo que sou tropicalista até hoje."
Samba-enredo ornamental
O manifesto de intenções de Gil é exposto nas duas primeiras músicas do disco, "Quanta", dele, e "Ciência e Arte", de Cartola e Carlos Cachaça.
"Sei que a arte é irmã da ciência/ Ambas filhas de um Deus fugaz", canta Gil em "Quanta" -que conta com a participação de Milton Nascimento.
A música "Ciência e Arte" foi uma das inspirações do disco. "É um samba-enredo ornamental, poético e dedicado a louvar as ciências e os campos do conhecimento no Brasil. É a música-emblema do disco", diz.
Com 25 músicas, o álbum foi concebido com uma coluna vertebral: "Quanta", "Dança de Shiva", "Ciência em Si", "Átimo de Pó", "Pop Wu Wei", "Objeto Sim, Objeto Não".
Há ainda uma 26ª faixa que ficou de fora da primeira fornada do disco. Depois que o CD estava pronto, Gil resolveu incluir "Objeto Ainda Menos Identificado", uma parceria de Lucas Santana com Moreno Veloso, filho de Caetano (leia texto ao lado).
A música é uma colagem de citações de textos e de músicas que foram sampleadas -de cantos indígenas a Sex Pistols.
Para "Objeto Ainda Menos Identificado" entrar em próximas prensagens é necessária a anuência dos autores das citações e dos samplers usados.
As outras músicas, segundo Gil, orbitam em volta desse eixo abordando conceitos adjacentes. Religião, por exemplo, está presente em "Água Benta".
Gil não se preocupa com a possibilidade de as músicas que falam de tecnologia, como "Pela Internet", ficarem datadas.
" 'Pelo Telefone' (oficialmente o primeiro samba gravado), do Donga, é datado. Está comemorando 80 anos. Está datadíssimo", ironiza. "É por estar falando em quark, neutrino, Internet? Tem coisas que são datadas. Qual é o problema com datas?", pergunta.
Gil elaborou "Quanta" seguindo os conceitos do Yin e Yang (os dois opostos/complementares da filosofia taoísta. O primeiro disco é mais pulsante, o segundo é mais tranquilo. No segundo estão concentradas as homenagens: "De Ouro e Marfim", para Tom Jobim, "Sala do Som", para Milton Nascimento, "Um Abraço no João", para João Gilberto, "O Mar e o Lago", para Mário Lago.
Há outras homenagens. O disco é dedicado a Cássia Eller, Zeca Pagodinho e Chico Science, que recebe uma homenagem indireta em "Vendedor de Caranguejo", de Gordurinha. "Cheguei a oferecer essa música para o Chico gravar. Eu dizia para ele: 'Olha aqui o manifesto mangue beat. Já tinham feito antes de você' ", diz.
Hoje, Gil promove a estréia nacional do show de "Quanta", em uma curta temporada no Palace.
Ele deve cantar 14 ou 15 músicas do novo disco e nove do resto da carreira, entre elas "Palco", "Expresso 2222", "Refavela" e "SIm, Foi, Você" -música de Caetano que Gil não canta em público há mais de 20 anos.
Show: Quanta
Artista: Gilberto Gil
Onde: Palace (av. dos Jamaris, 213, Moema, tel. 011/531-4900)
Quando: Hoje, às 21h30, amanhã e sábado, às 22h, e domingo, às 20h
Quanto: R$ 20 a R$ 50

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