São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
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Prêmio Nobel vê nos testes o futuro da medicina preventiva

ALEXANDRA OZORIO DE ALMEIDA

POR ALEXANDRA OZÓRIO DE ALMEIDA
O biólogo molecular Walter Gilbert, 65, prêmio Nobel de Química em 1980 por seu trabalho sobre a estrutura e a função do DNA, vê os novos testes de propensão genética como um enorme avanço para a medicina preventiva.
Gilbert diz que nos próximos cinco anos, provavelmente, todas as pessoas estarão se testando para saber a que tipo de doenças são suscetíveis e quais cuidados devem tomar, principalmente em relação aos diversos tipos de câncer.
Gilbert é doutor em matemática pela Universidade de Cambridge (Inglaterra) e se especializou em química e física na Universidade de Harvard, nos EUA, onde é professor desde 1968. O trabalho pelo qual foi premiado com o prêmio Nobel ajuda a compreender por que as células se tornam cancerosas.
(AOA)
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Folha - Qual a opinião do sr. sobre os novos testes de DNA para prever doenças por meio da propensão genética?
Walter Gilbert - Acho que é um enorme avanço em casos como o câncer da mama, especialmente no diagnóstico de pessoas com parentes que apresentaram a doença. Se você der positivo em um exame BRCA-1 ou BRCA-2, tem uma probabilidade muito alta de desenvolver a doença no decorrer da vida. Esse tipo exige um tratamento diferente dos outros tipos de câncer de mama, então você pode fazer certas coisas para tentar prevenir a doença, como mamografias prematuras, que oferecem uma detecção precoce. Mas as pessoas que testam negativo devem ter em mente que só cerca de 10% de todos os casos de câncer no seio são causados por mutação genética. Saber que você não tem predisposição genética para desenvolver o câncer não elimina toda a chance de contrair a doença, pois pode adquiri-la por outros motivos. O teste ajuda de fato de 1% a 2% de todas as mulheres, mas lembremos que isso é muita gente.
Folha - E qual a utilidade dos testes para detectar doenças incuráveis ou sem tratamento conhecido?
Gilbert - Isso é muito interessante. Estão disponíveis testes que detectam a predisposição a doenças sem cura como o mal de Alzheimer. Metade das pessoas gostaria de fazer esse teste, e a outra metade, não. É uma decisão muito pessoal. Muitas pessoas querem saber para ordenar suas vidas de forma diferente.
Folha - Existe um temor de que empresas podem começar a exigir esses testes na hora da contratação. Como lidar com esse problema?
Gilbert - Estamos nos movendo rapidamente no sentido de resolver essa questão legalmente, tornando ilegal a exigência dessas informações. Nos EUA, frequentemente o empregador paga a previdência do empregado. Essa relação cria muitos problemas, que não acontecem em outros países em que o sistema de previdência é independente. Estão sendo criadas leis para impedir o uso ou mal uso dessas informações genéticas, transformando-as em um assunto particular, leis que impedem discriminação contra as pessoas e que controlam as seguradoras.
Folha - A possibilidade de detectar se seu filho apresentará determinados problemas não pode levar a um aumento no número de abortos preventivos?
Gilbert - É possível o casal saber desses problemas a tempo de fazer um aborto, mas as doenças que a criança pode apresentar são as mesmas que podem afetar os pais, que aprenderam a conviver com elas. Se você tem grande chance de transmitir uma doença séria ao seu filho, não é caso de fazer aborto, mas de evitar ter filhos.
Folha - Qual deve ser o impacto desses testes no futuro?
Gilbert - Imagino que nos próximos cinco anos muito mais testes genéticos serão elaborados. Nesse ponto provavelmente estaremos testando todo mundo, porque todas as pessoas vão ter um ou outro ou vários desses genes. Então cada um de nós vai saber a quais tipos de doença somos suscetíveis. Médicos vão fazer uma batelada de testes nas crianças para poder dar conselhos como cuidado com colesterol ou prevenir determinados tipos de câncer. Isso levará a medicina mais para a área preventiva.

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