São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 1997
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Rock imita o que a MPB tem de pior

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Claro que temos de elogiar uma iniciativa como o festival Abril Pro Rock, que estava marcado para o fim-de-semana passado em Recife/Olinda. Não deve ser fácil deslocar praticamente toda a cena de rock no Brasil para uma cidade cuja produção pop era desconhecida no restante do país até há três anos.
Mas é óbvio também que a escalação das bandas traz algo de muito preocupante, desanimador até. Por mais que a gente saiba que a presença de medalhões garante um mínimo de sucesso comercial, fica difícil engolir que um evento com Paralamas do Sucesso e Arnaldo Antunes fechando a primeira noite possa ter qualquer compromisso com o novo.
Notamos, assim, que o rock nacional macaqueia o que de mais pernicioso a MPB tem: o continuísmo, a obrigatória bênção dos veteranos à rapaziada.
Para uma nova banda ser boa de verdade, é preciso que os Paralamas a chancelem, os Titãs se declarem fãs, que alguém do Legião Urbana diga uma palavra favorável.
E, infelizmente, com poucas exceções (brincando de deus e Pin Ups, talvez), a turma iniciante sente-se enlevada por conseguir o nihil obstat dos tiozinhos caetânicos.
Marisa Monte, Chico César, Arnaldo Antunes (ele de novo!), para citar alguns nomes mais "expressivos", não representam ruptura alguma para a MPB. São apadrinhados do establishment, personificam a continuidade da MPB no que ela tem de mais cosmético -o hippismo diluído, a estagnação formal, a atitude indolente.
Livre da tradição contemplativa e da estética banquinho-e-violão que pesam sobre os ombros da MPB, seria de se esperar que a nova geração do rock alfinetasse mais seus antecessores, tentasse pôr em prática algum tipo de ruptura.
Não é o que vemos.
Ao que tudo indica, as bandas que surgem da inesgotável cena mangue beat já nascem sob o afago dos nomões. Antes mesmo de explodir, sucumbem à cartilha do circuito USP-Ibiúna (que, entre outras coisas, nos deu os Titãs e o atual presidente da República).
Os grupos "sulistas" nada ficam a dever aos de Recife em matéria de subserviência. Há pouco, a TV mostrou uma deprimente entrevista em que Os Raimundos se sentiam no sétimo céu por ganhar elogios de... Rita Lee (Joe Strummer, do Clash, provavelmente teria tomado uma overdose de veneno se, no auge do punk, fosse considerado bacana por Mick Jagger ou Paul McCartney).

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