São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 1997
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Pinturas testemunham Descobrimento

FEDERICO MENGOZZI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Pena que não houvesse um pintor na armada comandada por Pedro Álvares Cabral. Por mais que a carta de Pero Vaz de Caminha descreva em minúcias a terra e sua gente, não existem imagens do instante da descoberta do Brasil.
Foi preciso esperar mais de três séculos e meio para que, sobretudo por obra dos pintores acadêmicos do Segundo Reinado, se conseguisse, com alguma arte e muita imaginação, reconstituir os primeiros movimentos da criação de um novo país.
São quadros meramente ilustrativos, que, colocados na sequência em que se deram os acontecimentos, se transformam numa espécie de história em quadrinhos que pode ser "lida" com muito prazer e alguma surpresa.
Em "A Providência Guia Cabral" (Pinacoteca do Estado, São Paulo), Eliseu Visconti (1866-1944) faz uma alegoria do navegador que singra os mares confiante em si mesmo, mas sem dispensar o auxílio da sorte -ou da Providência.
Já "Descobrimento do Brasil" (Museu Nacional de Belas Artes, Rio), de Aurélio de Figueiredo (1856-1916), mostra o momento exato em que se avista a terra.
Pedro Álvares Cabral aponta para o horizonte com a mão esquerda, vestido como se fosse a um baile de gala -e isso depois de um mês e meio de mar, com todo o desconforto que caracterizava as viagens marítimas daquele tempo.
O português José Malhoa (1855-1933) também registra a cena em "Cabral Avista a Costa Brasileira" (Real Gabinete Português de Leitura, Rio) e retrata um comandante menos plácido, em pinceladas quase expressionistas.
Descoberta a terra, é preciso entrar em contato com sua natureza e, se existirem, seus habitantes.
É a cena que Oscar Pereira da Silva (1867-1939) recria em "Desembarque de Cabral em Porto Seguro" (Museu Paulista, São Paulo), com a figura do comandante Nicolau Coelho junto ao estandarte da Ordem de Cristo, trocando presentes com os indígenas.
A contrapartida, a visita dos habitantes da terra a uma das naus, o mesmo artista recriou em "Índios a Bordo da Nau Capitânia de Cabral" (Museu Paulista).
Mal-humorado como só um pintor acadêmico pode ser, Pereira da Silva reconstitui a cena que Cabral montou para impressionar os nativos, mas nem pensou em registrar o medo que sentiram de uma galinha que lhes foi mostrada.
O episódio da Primeira Missa rezada em terra brasileira comparece em dois famosos quadros acadêmicos: "Elevação da Cruz" (Museu Nacional de Belas Artes), de Pedro Peres (1850-1923), e "Primeira Missa" (Museu Nacional de Belas Artes), de Vítor Meireles (1832-1903).
Em ambos, o congraçamento de europeus e indígenas, que presenciam a cena com curiosidade e sem entender direito o que se passa. Só que, em vez de retratar a Primeira Missa, Meireles na verdade retratou a segunda, celebrada no dia 1º de maio de 1500, em terra firme.
Bem mais tarde, Cândido Portinari (1903-1962) reproduziu a cena numa têmpera sobre tela em que se vale das lições do cubismo: "A Primeira Missa no Brasil" (Banco Central, Brasília).
É hora de comunicar a descoberta a dom Manuel 1º. Em "Leitura da Carta de Caminha" (Biblioteca Municipal, SP), também de Aurélio de Figueiredo, um público especial -Pedro Álvares Cabral, mestre João e frei Henrique de Coimbra- ouve atentamente a leitura da carta pelo escrivão.
Então, contam os historiadores, uma nau comandada por Gaspar de Lemos se dirigiu a Portugal, e a armada retomou o caminho para as Índias, de onde Cabral voltaria cheio de glória, para morrer duas décadas depois, esquecido.

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