São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 1997
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Koltès expõe comércio do desejo

NELSON DE SÁ
DO ENVIADO ESPECIAL

"Na Solidão dos Campos de Algodão" contrapõe as leis do mercado àquelas da paixão, ao confrontar um executivo com um michê, que se encontram, em ambiente algo etéreo, na rua de uma grande cidade. Discutem, em longos solilóquios, "bifes" obsessivos de parte a parte, as razões e os medos de um e outro.
Na Casa de Cultura Laura Alvim, o texto é apresentado diante de pouco mais do que duas dezenas de pessoas, numa pequena sala escura, em que o pesadelo da rua e da exposição urbana ameaça pela porta de vidro por onde entra um dos personagens.
Ricardo Blat faz o executivo -ou coisa assim, já que nada resta muito claro- que seguia seu caminho direto, de um prédio a outro, quando se desviou ao ver o michê e escapar da retidão.
A atuação de Blat, contida, tensa, mas que se abre aos poucos, é o que mantém a voltagem alta da apresentação. Não se tem bem certo o que ele faz, como vai reagir. É o personagem do mundo capitalista por excelência, diante de algo que confronta tudo o que faz.
O michê (o que não é claro, já que o que ele quer "comerciar" é a paixão, o desejo, não necessariamente por dinheiro) é feito por um igualmente impressionante Gilberto Gawronski -também presente em "A Dama da Noite".
Ele está aberto, emocional e fisicamente franco, buscando derrubar as resistências do outro, respondendo como pode, por vezes com a própria angústia, no mais das vezes com compaixão e carinho, à crueldade do outro.
Num cenário de decadência urbana, escuro e sujo, tentam um "deal", um negócio, e fracassam. O texto, seco e cortante, é do ótimo Bernard-Marie Koltès, da mais conhecida "Roberto Zucco".
(NS)

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