São Paulo, domingo, 27 de abril de 1997
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Cuiú-Cuiú é um exemplo

Gilberto Dimenstein

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

O caso de Cuiú-Cuiú, um vilarejo perdido na Amazônia, é exemplar sobre como a Justiça é falha no Brasil, em especial, quando estão em jogo os grupos vulneráveis. Mesmo quando são apresentadas todas as evidências de crime.
Em 1992, estava viajando pelo Brasil, seguindo rotas de meninas escravizadas e exploradas sexualmente. Em nenhum lugar foi possível obter tanta documentação e provas como em Cuiú-Cuiú. As meninas foram fotografadas nos cativeiros, nomes dos cafetões apresentados, papéis mostravam as doações que faziam aos policiais.
Logo depois de a reportagem ter sido publicada na Folha, as meninas foram libertadas pela Polícia Federal, com testemunhos colhidos. Os locais em que viviam e seus responsáveis foram filmados. O material rodou o mundo e atraiu as atenções internacionais para o Brasil na questão da prostituição infantil.
Mesmo assim, a Justiça Federal empurrou o caso para a Comum. Não se ouviram testemunhas e nem os oito criminosos que traficavam mulheres foram indiciados pelo Ministério Público.
Fez-se o que se costuma fazer no Brasil. Dar uma justificativa à opinião pública e, depois, em meio à apatia da opinião, o caso vai sendo esquecido, movido pela burocracia judiciária ou incompetência policial.
Não é, em hipótese alguma, um caso isolado. Num convênio com o Ibase, o Unicef rastreou a história de 200 crianças assassinadas no Rio. Quando o caso chegava ao Tribunal, poucas vezes, não havia provas suficientes nem testemunhas, muitas das quais não se apresentam com medo de retaliações.
O exemplo de Cuiú-Cuiú reforça a suspeita de que, entre os poderes públicos, o Judiciário é o menos aberto e transparente. Portanto, menos pressionado pela opinião pública -por isso, é o que menos se adaptou aos avanços da sociedade brasileira.

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