São Paulo, domingo, 27 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Pavor atinge ricos e pobres

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Crianças pobres e ricas costumam se assustar com o sobrenatural. O medo de espíritos foi relatado por meninos e meninas tanto do Rio Branco quanto da escola pública da zona norte.
"É um medo irracional, daquilo que não pode ser explicado", diz a psicoterapeuta Helena Bromberg.
Henry, 8, estudante do grupo municipal, conta que sua mãe costumava ouvir barulho de talheres e facas batendo dentro da gaveta do armário. "Um dia, ela foi ao médico e o médico mandou que ela comprasse um cachorro. Aí o espírito passou para o cachorro e ele foi ficando triste até que morreu."
Nunca mais o espírito apareceu, mas Henry diz que continua com medo. A menina Tharling, 9, da mesma escola, tem medo de ficar sozinha quando a mãe sai para fazer compras. "O vento fica batendo no pé de abacate e parece uma assombração chegando."
Suelen, 10, tem medo da própria boneca. "Gosto dela durante o dia, mas, de noite, ela fica me olhando, piscando o olho e mexendo o pescoço, como se tivesse um espírito dentro dela."
No prédio da Beatriz, uma mulher caiu pela janela e morreu. "Um mês inteiro a gente ficou achando que ela ia voltar e puxar a gente pelos pés."
No grupo da escola municipal, três disseram que já haviam perdido alguém da família assassinado ou atropelado. Todos contaram que já haviam visto um morto na rua. "Dois carros passaram por cima do homem e o miolo e os olhos saíram para fora", diz Maria, 12. "Vieram pegar aquelas coisas e um policial perguntou se a gente queria fazer sopa de defunto."
O excesso de atividades -outra causa do estresse- é comum entre crianças do Rio Branco. Suzana, por exemplo, tem aulas fora todos os dias da semana, de teclado, violino e sapateado. Gabriela tem quatro dias de natação e balé.
O medo de que os pais se separem, que venham a perder o emprego ou sua fonte de renda, foi citado por várias crianças. "Nem gosto de pensar", diz Ricardo, 10.
Uma fonte de estresse importante, mas que quase não apareceu entre as crianças ouvidas, é a baixa auto-estima. No Rio Branco, usar óculos e aparelho nos dentes incomoda as crianças. "Eles já arrumam um apelido e você vai encolhendo", diz Daniel, 9.
Nota baixa chega a preocupar, mas nenhum deles quer ser o melhor sempre. "Ninguém quer ser CDF", diz Marina, 9.
(AB)

Texto Anterior: Crianças relacionam Deus a azares diários
Próximo Texto: Morte de índio deve ser julgada até agosto
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.