São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 1997
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Vida de mafioso causa polêmica nos EUA

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DE NOVA YORK

O livro "Underboss" (tradução possível: O Subordinado), que retrata a vida de Salvatore Gravano na máfia, está provocando polêmica nos Estados Unidos. E, de quebra, uma batalha judicial envolvendo o Estado de Nova York, famílias das vítimas do mafioso, o autor do livro (Peter Maas) e a editora que o publicou.
Direta ou indiretamente, Gravano participou de 19 assassinatos. Não foi tanto pelos crimes que ele ficou conhecido, mas por ter testemunhado contra John Gotti, exercendo papel importante na condenação do chefão da máfia nova-iorquina à prisão perpétua.
Para escrever a obra, o autor Peter Maas gravou cerca de 65 horas de conversas com o mafioso, ao longo de 18 meses.
"Todos os nossos encontros foram feitos com o conhecimento da polícia, que lhe dava proteção, mas cada um num lugar diferente", explicou Maas à Folha.
Lançado há duas semanas, o livro já está nas listas dos dez mais vendidos nos Estados Unidos.
O lançamento da obra, no entanto, revoltou as famílias das vítimas de Gravano, que decidiram pedir na Justiça o bloqueio dos lucros com a venda dos 225 mil exemplares distribuídos pelas livrarias norte-americanas.
Uma lei de 1987 proibia criminosos de faturarem vendendo histórias sobre seus crimes. Quatro anos depois, a lei foi considerada inconstitucional. Em 1992, porém, acabou sendo modificada, dando às vítimas o direito de exigir os lucros auferidos pelos criminosos.
Dennis Vacco, promotor do Estado de Nova York, quer que o autor e a editora HarperCollins provem que Gravano não recebeu dinheiro para contar sua história.
A HarperCollins alega ter assinado contrato com Peter Maas, não com Gravano. E o autor se recusa a mostrar o contrato, alegando que seria invasão de privacidade.
"Eu sou a vítima. Tive um trabalhão, desvendei a alma da máfia, no mínimo tenho direito a lucrar com minha obra", disse Maas. "Se Sammy Gravano pode aparecer na rede de TV ABC, o que há de errado em ter falado comigo?"
"Temos de parar de ser hipócritas. As vítimas de Gravano eram, de uma forma ou de outra, ligadas à máfia, algumas até mais perigosas do que ele. E não pode ser mera coincidência seus familiares terem contratado para me atacar o mesmo advogado que defendeu John Gotti", completou o autor.
Além do livro, uma versão em áudio, narrada pelo ator Philip Bosco, está à venda nos EUA.
Em "Underboss", Peter Maas faz questão de defender Sammy Gravano e o "pacto de honra" que existe entre os mafiosos.
"A máfia exige uma lealdade que não se encontra em outro lugar", diz Maas. "Não foi Sammy Gravano quem traiu a máfia, nem foi ela quem o traiu. Como ele mesmo me disse, John Gotti não representava a verdadeira máfia."
O autor acha que Gravano mostrou ser um homem corajoso. "Não é todo mundo que teria peito para enfrentar John Gotti."
Segundo o escritor, Gravano deixou o programa federal que lhe dava proteção policial 24 horas por dia. "É a maior prova de que ele não tem medo de nada."
Vivendo em lugar ignorado, o ex-mafioso teria encontrado emprego. "Ele está se virando bem."
Além de ter sua história contada por Peter Maas, Sammy Gravano deu uma entrevista para a apresentadora Diane Sawyer, da ABC.
Ele aproveitou a ocasião para fazer seu marketing pessoal, referindo-se a si próprio como a um herói.
"Você pode me comparar a um soldado no Vietnã que teve de matar centenas de pessoas", foi uma de suas declarações.

Livro: "Underboss"
Autor: Peter Maas
Quanto: US$ 25 (308 págs.)
Onde encomendar: Livraria Cultura (tel. 011/285-4033)

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