São Paulo, terça-feira, 29 de abril de 1997 |
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Questões de ordem
FREDERICO VASCONCELOS "O Brasil tem urgência de deixar a Vale em ordem. Quer dizer, está em ordem, mas pode melhorar".A frase é do empresário Antonio Ermírio de Moraes, em entrevista ao repórter Antônio Carlos Seidl, deste jornal, às vésperas do leilão de privatização da Companhia Vale do Rio Doce. O aparente tropeço, quase um ato falho de um dos concorrentes, pode servir como reforço para a tese central dos que se opõem à privatização. Afinal, como indaga o ex-presidente Itamar Franco, espécie de porta-voz dos descontentes, "que insondáveis motivos justificam sua venda"? Evidentemente, não terá sido apenas por falta de ordem interna na casa -como acontece em muitas estatais- que se está buscando a privatização da Vale, acenando-se com a eficiência e o fôlego privados. O bom senso recomendaria remeter a discussão para um outro nível, outra ordem -a questão da chamada nova ordem econômica mundial, da globalização, do papel e dos limites do Estado (no caso brasileiro, perdulário e incapaz de exercer suas funções sociais básicas, e sem cacife para continuar investindo adequadamente na empresa). A dificuldade de definir com clareza o desafio de gerir uma gigante do porte da Vale também não deve ser atribuída apenas a um dos concorrentes. "Para conhecer a Vale, vai demorar uns dois anos", admitiu Antonio Ermírio. Benjamin Steinbruch, que lidera o outro grupo, também empresário de companhia de capital fechado, confessa que "a Vale não pode ser mexida". "Teríamos seis meses para entender realmente a Vale, discutir a estratégia com a diretoria e os demais funcionários", diz, na mesma edição. A hesitação oficial nos últimos meses -ora propondo a desestatização da Vale, ora tirando o assunto de pauta para não comprometer outros objetivos, como a obtenção de apoio suficiente para garantir a reeleição do presidente FHC- não deve ter contribuído para firmar, na opinião pública, a certeza de que a privatização é o melhor caminho para o país. "Eu não era favorável à privatização da Vale até que fui vendo argumento por argumento e me convenci", afirmou FHC. A pesquisa do Datafolha publicada domingo último revela uma divisão na opinião pública (43% contrários à privatização e 38% apoiando a venda). À parte os argumentos técnicos e econômicos -e há alegações consideráveis nos dois lados-, trata-se de uma discussão com forte teor político e emocional. Resta saber o quanto da divisão aferida pela pesquisa reflete posições sedimentadas entre a população. Os primeiros leilões de empresas estratégicas geraram confrontos, violência intolerável de grupos organizados. O governo afirma estar preparado para uma prova maior, a batalha dos tribunais que promete ser acirrada. São obstáculos a enfrentar, naturais num processo democrático. Para aqueles de memória curta, é bom que se diga que o cenário é bem mais arejado e saudável do que o que prevalecia, anos atrás, quando outra decisão estratégica -os contratos de risco da Petrobrás- dependia apenas da caneta do general-presidente. Texto Anterior: A roda da fortuna Próximo Texto: Missão cumprida Índice |
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