São Paulo, domingo, 4 de maio de 1997
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Fertilizações culturais

MARCOS FLAMÍNIO PERES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Michael Palmer, um dos organizadores da antologia "Nothing the Sun Could Not Explain", é um dos mais importantes poetas na atual cena contemporânea norte-americana. Foi um dos expoentes, no final dos anos 80, do "Language Poetry", movimento que renovou a dicção da poesia americana ao lhe injetar um caráter mais nervoso e crítico.
O autor tem livros traduzidos para várias línguas. No Brasil, há uma edição de "Passages" ("Passagens", tradução de Régis Bonvicino, Gráfica Ouro Preto).
Leia, a seguir, trechos da entrevista que o autor -que mora em San Francisco- concedeu por fax à Folha.
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Folha - Qual o público-alvo desta antologia?
Michael Palmer - Os leitores e escritores interessados nos fluxos, ecos e mútuas fertilizações culturais em escala mundial.
Folha - Que semelhanças o sr. vê entre a poesia brasileira representada na antologia e a poesia norte-americana do mesmo período?
Palmer - Acho que há pouco em comum entre elas. Mas pode-se encontrar muito em comum entre a chamada "contratradição" da poesia americana, mais audaciosa e experimental, na qual todos os elementos materiais da expressão são explorados e questionados ativamente. Trata-se de uma poesia de crítica e renovação social, uma poesia que tece uma reflexão constante sobre seu meio de expressão e seu relacionamento um tanto tênue com a cultura materialista.
Folha - Que aspectos o sr. ressaltaria nas poesias deste livro?
Palmer - Encontro muita diversidade na coleção. Em toda a obra, existe um relacionamento sofisticado com a herança modernista de exploração e experimentação, além de um compromisso com a renovação das formas e o desmantelamento das ideologias sociais e estéticas opressivas. Há um questionamento ativo e compartilhado tanto da consciência quanto do mundo objetivo.
Folha - Quais foram os critérios de seleção dos poemas?
Palmer - A antologia não pretende ser definitiva, e, inevitavelmente, poetas de valor foram omitidos. Nossa esperança é de que ela seja vista como um primeiro gesto, a abertura de uma porta pela qual muitos outros contemporâneos poderão passar no futuro.
Folha - O sr. tem dados para avaliar qual será a recepção nos EUA?
Palmer - Não tenho nenhuma idéia concreta de como será recebida. Muitas pessoas expressaram entusiasmo pelo projeto. Desconfio que boa parte da grande imprensa vá ignorá-lo, assim como ignora quase toda a poesia de algum valor nos EUA. Mas ainda resta uma importante comunidade de leitores engajados que nos sustenta diante de um mercado indiferente.
Folha - Quais as tendências atuais da poesia norte-americana?
Palmer - Existe uma diversidade enorme de práticas poéticas nos EUA, que variam desde o convencional e satisfeito consigo mesmo até o profundamente inovador. Nos últimos 10 a 15 anos, o mais notável, talvez, tenha sido a ampla emergência de jovens poetas mulheres de habilidade extraordinária, além de poetas originários de várias culturas minoritárias.
Folha - Como o sr. entrou em contato com a poesia brasileira?
Palmer - Primeiro por meio de antologias e revistas literárias. Depois, em festivais de poesia na França e Dinamarca, tive a sorte de conhecer Haroldo de Campos e outros poetas brasileiros. Já tinha consciência do relativo descaso com que era tratada a poesia brasileira. Assim, quando Régis Bonvicino, Nelson Ascher e João Almino me falaram sobre o projeto, fiquei feliz em poder me envolver.
(MFP)
Tradução de Clara Allain.

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