São Paulo, domingo, 4 de maio de 1997
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Proteção às avessas

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Segundo o noticiário da semana passada, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estaria estudando a adoção de um "selo social" em todos os países como garantia do cumprimento de padrões trabalhistas mínimos.
Essa é uma nova versão da "cláusula social" que muitas nações desenvolvidas pretenderam aprovar no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Se adotada, a OMC ficaria com plenos poderes para aplicar sanções comerciais aos violadores dos padrões trabalhistas.
A tese vem revestida de argumentos humanitários em favor dos povos mais pobres. Mas como no campo dos negócios os países ricos jamais defenderam estratégias desse tipo, o seu repentino surto de generosidade nos põe com a pulga atrás da orelha. O que há por baixo disso?
Os países do hemisfério norte enriqueceram extraordinariamente, mas não conseguiram resolver o problema do desemprego. Na verdade, suas economias crescem e o emprego decresce. Os estadistas do Grupo dos Sete (G7) se reuniram várias vezes para equacionar o flagelo e, até hoje, nada.
Para tentar escapar dessa contradição, nossos "muy amigos" do hemisfério norte argumentam, agora, que os países pobres são os causadores do seu desemprego. Mais especificamente, as nossas exportações, por se basearem em custos mais baixos (especialmente de mão-de-obra), estão destruindo os postos de trabalho da Europa e Estados Unidos.
A defesa da elevação das condições de trabalho nos países pobres, portanto, nada tem de humanitária. Ao contrário, é mais um lance de deslavado protecionismo. Ela visa, no fundo, encarecer nossas exportações.
Os países desenvolvidos vivem buscando motivos para bloquear as exportações dos países em desenvolvimento. Ora é a necessidade de preservar o meio ambiente dos países mais pobres. Ora é a necessidade de padronizar os processos e produtos por meio das ISOs. Outras vezes é a necessidade de melhorar o estado de saúde de nosso gado, galinhas, peixes e plantas.
E agora vem a questão de elevar os padrões trabalhistas, melhorar os salários e combater o trabalho infantil.
É claro que essas são metas de todos os países. O Brasil vem trabalhando nessa direção há vários anos. Não há quem não queira gerar empregos, aumentar salários e educar as crianças.
Mas tudo isso é resultado de investimentos, produção, exportação etc. e não do uso de sanções comerciais ou selos sociais.
Ninguém conseguiu provar que tais medidas contribuam efetivamente para gerar empregos, pagar bons salários e manter as crianças na escola.
Se o propósito é afastar o Brasil do comércio internacional, o tiro é certeiro. Mas se o objetivo é, de fato, melhorar nossas condições de trabalho, não há saída: precisamos produzir mais, crescer depressa e exportar muito.
Esse é um daqueles temas ingratos para ser abordado, pois, no seu debate, os países ricos tendem a ficar com a fama de defensores dos nossos trabalhadores e nós corremos o risco de ficar sem o que fazer com uma monumental legião de desempregados.
Afinal, será que o Primeiro Mundo está com medo do Terceiro Mundo? É isso que a OIT pretende?

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