São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

País quer ser modelo no século 21

SILVIO CIOFFI
ENVIADO ESPECIAL À ÁFRICA DO SUL

Apesar de predicados geográficos inigualáveis, de juntar reservas de animais como o Parque Nacional Kruger a lugares como a Cidade do Cabo, de beleza comparável à do Rio de Janeiro, a África do Sul já foi uma espécie de "país proibido" para o turista até 1990.
Foi nesse ano que, diante de intensa pressão internacional, o então governo de Frederik de Klerk, que hoje tem 61 anos, legalizou organizações antiapartheid (segregação racial), libertou presos políticos, levantou o estado de emergência, aboliu a lei de segregação pública e iniciou conversações entre o governo branco e o CNA (Congresso Nacional Africano), maior organização negra do país.
As primeiras eleições multirraciais, em abril de 94, levaram o ex-preso político Nelson Mandela, 79, à presidência, colocando o ponto final no apartheid, regime iniciado oficialmente em 1948.
Mundialmente famoso pela oposição ao regime racista, Mandela havia passado 27 anos na prisão, muitos deles na ilha Robben (que pode ser visitada num barco que parte do Victoria & Alfred Waterfront, Cidade do Cabo).
Depois de trilhar um longo percurso contra a opressão, Mandela foi eleito num consenso nacional, e a África do Sul deixou de ser "país proibido" para o turismo.
Então, o que era negativo passou a ser positivo, e a herança multirracial virou um dos principais trunfos desse país banhado pelos oceanos Atlântico e Índico, com praias e paisagens magníficas, safáris fotográficos e que alterna cidades modernas a outras de arquitetura colonial, que produzem no Cabo o seu vinho desde o século 17.
Responsável por quase 50% da atividade industrial do continente africano, maior produtora mundial de ouro, a África do Sul tem agora diante de si o desafio de tornar-se o país-modelo no século 21.
E o turismo, maior indústria do mundo e hoje atividade vital para a economia sul-africana, pode ter papel importante na superação das diferenças sociais que ainda existem entre os negros, que representam 75% da população, e os brancos, tradicionais detentores do poder político e econômico.
O fim da intolerância
O advogado de etnia xhosa (pronuncia-se "côssa") Nelson Rolihlahia Mandela, que fundou na juventude a ala militar do CNA, é o primeiro presidente negro a ser eleito livremente na África do Sul. É também o chefe de um governo pluripartidário e multirracial que de início juntou o ex-presidente branco Frederik de Klerk e o chefe zulu Mangosuthu Buthelezi, 69, líder do partido Inkhata -tradicional adversário do CNA- para pôr fim à intolerância.
Foi por isso que Mandela e De Klerk dividiram o Prêmio Nobel da Paz em 1993. Mas, como a história não começa e nem termina com o fim do apartheid, vale lembrar de seus fatos e personagens.
Entre as biografias dos personagens que fazem parte da história sul-africana está o português Bartolomeu Dias (?-1500), que contornou em 1487 o Cabo das Tormentas, depois chamado de Cabo da Boa Esperança, descobrindo a passagem entre os oceanos Atlântico e Índico.
Transformado em ponto estratégico da rota comercial para a Índia, a região do Cabo era habitada por índios bosquímanos, temíveis pelas flechas envenenadas, e também por xhosas, zulus e khois.
A colonização européia foi iniciada só no século 17, com a chegada do holandês Jan van Riebeeck (1619-1677), que fundou a Cidade do Cabo em 1652.
Nasce um país
Alto funcionário da Companhia das Índias Orientais, Van Riebeeck construiu um entreposto que abastecia os navios e um forte, o Castelo da Boa Esperança, onde funciona um museu.
Entre os personagens negros, a figura do chefe zulu Shaka (1787-1828) tem grande importância para a história sul-africana.
Dingane, que o sucedeu, derrotou em 1838 os bôeres, pioneiros de origem européia, graças à máquina militar organizada por Shaka (que contou com 50 mil guerreiros zulus e exerceu seu domínio numa área de 500 mil km2).
Mas foi Paul Kruger (1825-1904) o político africânder (descendente dos bôeres) que consolidou a identidade política da África do Sul, lutando contra a anexação do Transvaal pelos ingleses, que a essa altura já dominavam politicamente a Província do Cabo.
Kruger presidiu o Transvaal entre 1883 e 1890. Foi um dos líderes da guerra contra o Reino Unido e morreu exilado na Suíça. A guerra pela supremacia das minas de ouro no Transvaal opôs 500 mil soldados britânicos e 55 mil combatentes da República Sul-Africana e Estado Livre de Orange.
Presença britânica
Entre os ingleses, Cecil John Rhodes (1853-1902) foi o personagem político que mais se destacou.
Radicou-se na Cidade do Cabo ainda adolescente e fez fortuna com a descoberta das minas de diamante em Kimberley.
Entre os sonhos de Rhodes, que emprestou seu nome à antiga Rodésia (hoje Zimbábue), estava a absorção das repúblicas bôeres.
As primeiras leis segregacionistas foram editadas por James Hertzog (1866-1942), general e premiê da União Sul-Africana, que fundou o Partido Nacional.
Rivalizando em carisma com Mandela, o líder religioso Desmond Tutu, 66, enfatizou a luta política não violenta, encorajando sanções econômicas contra seu país. Antes de Mandela e De Klerk, o arcebispo Tutu ganhou o Nobel da Paz, em 1984.

Texto Anterior: Veja onde fica a África do Sul
Próximo Texto: PACOTES PARA A ÁFRICA DO SUL
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.