São Paulo, domingo, 25 de maio de 1997
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Um cenário para o médio prazo

ANA CLÁUDIA DE ALÉM; FLORINDA PASTORIZA; FABIO GIAMBIAGI

ANA CLÁUDIA DE ALÉM
FLORINDA PASTORIZA
FABIO GIAMBIAGI
A época que o Brasil viveu até 1994 tornava ociosa qualquer projeção de médio prazo. As incertezas eram de tal magnitude que projeções além de um horizonte de seis meses constituíam um exercício surrealista.
No terceiro ano após a estabilização provocada pelo Plano Real, entretanto, é chegada a hora de olhar mais à frente e tentar vislumbrar o que poderá acontecer ao longo dos próximos cinco ou seis anos.
Com esse intuito, fizemos um exercício de simulação para 1997/2002, cujas variáveis mais importantes são apresentadas a seguir.
Por motivos de espaço, uma série de questões que explicam as hipóteses adotadas e o conjunto dos resultados terá de ser omitida. Na tabela, são mostrados também os dados de 1996, para fazer uma análise comparativa.
Considera-se que o PIB terá um acréscimo médio de 4% ao ano. Ao longo do período, o investimento da economia -a preços de 1980- aumentaria gradualmente, até atingir quase 20% do PIB em 2002.
Esse aumento teria de ser viabilizado por uma queda da participação do consumo total -público e privado- no PIB, de quase oito pontos percentuais do PIB entre 1996 e 2002.
O setor público, ainda que continuando deficitário, iria se ajustando gradualmente, diminuindo o déficit operacional até 1% do PIB em 2002.
Essa diminuição do déficit decorreria de dois elementos. Primeiro, de uma redução do pagamento de juros, de 3,8% do PIB em 1996 para 2,6% do PIB em 2002. E, segundo, de uma queda relativa dos gastos correntes do governo federal, de Estados e municípios -de 25,5% do PIB, em 1996, para 23,9% do PIB seis anos depois.
Note-se que isso parece plenamente viável, já que essa queda relativa é consistente com o aumento real acumulado do gasto público corrente de 19% no período -menor que o crescimento acumulado do PIB, de 27%.
A redução gradual do déficit, o crescimento da economia, uma pequena monetização e a hipótese de uma receita de privatização de 5% do PIB nos próximos anos geram uma pequena queda da dívida líquida do setor público como proporção do PIB.
A melhora dos indicadores fiscais, porém, não garante uma melhoria similar do setor externo. O país continuaria tendo déficits em conta corrente da ordem de 4% do PIB, com um déficit comercial médio de US$ 14 bilhões e um endividamento externo crescente, embora menos intenso que o verificado nos anos 70/início dos anos 80.
Para avaliar adequadamente a performance da economia, é preciso lembrar que o crescimento da população seria de 1,2% a.a., muito abaixo da taxa anual de 2,7% das décadas de 60 e 70.
Portanto, o país não precisará crescer tanto como no passado, sem que isso implique uma queda do crescimento da renda per capita, que cresceria 2,4% a.a. em 1995-1998, taxa essa superior à média de 0,0% dos seis anos do governo Figueiredo (1979-1984), de menos 0,6% a.a. nos cinco anos de Collor/Itamar (1990-1994) e igual à média dos cinco anos do governo Sarney (1985-1989).
No próximo governo (1999-2002), a renda per capita, no nosso cenário, poderia ter um crescimento maior, de 2,9% a.a.
O quadro que se tem pela frente nos próximos anos é então de crescimento moderado, acompanhado por uma lenta melhora dos indicadores fiscais e uma piora dos indicadores de endividamento externo.
Do ponto de vista externo, o restante da década e o início da próxima devem ser encarados como uma transição entre os anos de poupança externa nula que a economia brasileira viveu até 1994 e o novo ponto de equilíbrio -entendido como uma situação na qual os coeficientes de endividamento deixam de ser crescentes- que só seria atingido na próxima década.
Nessa fase de transição, espera-se que o resto do mundo financie nossa acumulação de dívida e que o país aproveite a poupança externa para ampliar o investimento, com ênfase na superação dos gargalos da infra-estrutura e na ampliação da capacidade de produção de bens "tradables".
O risco é que, no caminho, algum acidente faça o mundo deixar de nos financiar. Se, entretanto, a economia mundial continuar mantendo a performance dos últimos anos, com um crescimento de 3% a 4% a.a. e juros relativamente baixos, o desequilíbrio poderia ser financiado e o país chegaria ao final do mandato do próximo presidente com uma renda per capita da ordem de US$ 5.600 a preços de hoje.

Fabio Giambiagi, 34, é economista do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Foi assessor do Ministério do Planejamento e Orçamento (governo Fernando Henrique Cardoso).

Ana Claudia Duarte de Além, 28, é economista do BNDES e mestre em economia pelo Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Florinda Pastoriza, 24, é economista do BNDES e mestre em economia pela FGV-RJ (Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro).

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