São Paulo, domingo, 25 de maio de 1997
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Molécula cerebral pode explicar distúrbios humanos

PAULO HENRIQUE BRAGA
DE LONDRES

O neurotransmissor serotonina pode ser uma das chaves para entender como as ligações entre neurônios, que ocorrem no interior do cérebro, se traduzem em ações e emoções humanas.
O trabalho está sendo realizado por Susan Greenfield, professora de bioquímica e medicina da Universidade de Oxford.
"A serotonina e a dopamina são importantes para entender esse processo, porque se originam na parte mais primitiva do cérebro e funcionam como fontes, atingindo o órgão de maneira ampla".
Segundo ela, a abordagem mais usual do estudo da consciência "tende a esquecer que ela é uma coisa subjetiva".
O que Greenfield tenta fazer "é desenvolver uma estrutura, uma explicação bilíngue que possa ser aplicada aos sentimentos do cotidiano e, ao mesmo tempo, à química do cérebro".
O objetivo de seu trabalho é entender quais as variações de emoções e de comportamento humano que os arranjos diferentes das células cerebrais originam.
Os resultados de seu estudo estão no livro "Journey to the Center of the of the Mind" (Viagem ao Centro da Mente), lançado em 1995.
A pesquisadora acredita que a depressão, por exemplo, seja resultado de um "excesso" de comunicação entre as células do cérebro.
"Minha teoria é a de que a depressão está ligada à comunicação entre um grupo grande demais de células do cérebro", afirma.
Ela cita o antidepressivo Prozac como uma das drogas que atuam no órgão, diminuindo a sensibilidade dos receptores de serotonina. Receptores são "portos celulares" onde uma determinada substância atraca.
Um dos focos de seu estudo é entender a razão da demora na obtenção de resultados com o uso de antidepressivos.
"Um antidepressivo demora cerca de dez dias para ter efeito terapêutico. Apesar disso, se você toma uma droga antidepressiva que vai acentuar a disponibilidade de serotonina, a reação bioquímica ocorre em poucas horas ou em um dia", diz ela.
Greenfield lembra que as pessoas que sofrem de depressão normalmente só se sentem melhores em um prazo que varia de dez dias a duas semanas após o início da administração de medicamentos.
Isso ocorre, segundo sua hipótese, por que os receptores não reagem imediatamente ao aumento de serotonina.
Apenas depois de terem tido contato com a quantidade maior da substância produzida pelo remédio é que se modificam, se tornando menos sensíveis.
Só então o medicamento passa a fazer efeito. A depressão poderia, então, ser o resultado de uma hipersensibilidade dos neurorreceptores.
"O que acontece com a depressão é que a questão principal não é exatamente o nível de serotonina, mas a sensibilidade dos receptores, dos alvos em que ela trabalha", diz ela.
Neurorreceptores menos sensíveis, mais lentos, significariam o fim da depressão.
"Drogas que possam impedir que as células recrutem umas às outras tão facilmente podem combater a depressão. Se tiverem um receptor de serotonina menos sensível, as células não poderão se recrutar tão rapidamente", afirma ela.
A pesquisadora explica que as células do cérebro podem se agregar "como pessoas se comunicando por telefone umas com as outras".
"Elas formam grupos que podem durar por milésimos de segundo apenas, e então novos grupos são formados. É mais ou menos como pessoas em uma festa, a mesma célula do cérebro pode participar de diversos grupos diferentes."
Cada reunião diferente de células do cérebro, ligadas por uma rede de neurônios, corresponderia a uma emoção ou comportamento diferente.
A pesquisadora acredita também que os diferentes níveis de consciência estejam relacionados a agrupamentos de neurônios no cérebro.

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