São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 1997
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Crescimento e emprego: EUA x Europa

JORGE MATTOSO

O pensamento econômico hegemônico dos anos 80 e da primeira metade dos anos 90 fez parecer que a dinâmica do emprego não seria mais determinada por variáveis externas ao mercado de trabalho e subordinada às decisões de investimento.
Para os economistas convertidos ao pensamento único, seria no próprio mercado de trabalho que se deveriam buscar as soluções para os seus problemas. Dessa forma, menosprezaram as questões do crescimento e da demanda agregada e deram prioridade para os ajustes internos ao mercado de trabalho.
Analisando um mercado de trabalho nacional, trataram de identificar os elementos geradores de uma suposta rigidez ou imperfeição do mercado, sejam eles sindicatos, o direito ou até os empresários. Comparando internacionalmente diferentes mercados de trabalho, trataram de identificar as diferenças e buscar suas causas, sempre no mercado de trabalho.
Comparações entre o comportamento do mercado de trabalho dos EUA e o de vários países da Europa nesta segunda metade dos anos 90 também foram nessa direção. As diferenças de taxa de desemprego foram debitadas à maior flexibilidade dos EUA e à maior rigidez do mercado de trabalho da Europa, no que diz respeito a salários, contratação, jornada de trabalho etc.
Para esses economistas, os EUA teriam feito a opção pelo emprego, enquanto a Europa manteria a opção pelo salário.
No entanto as diferenças no comportamento recente do mercado de trabalho dos países avançados dos dois lados do Atlântico podem ter outra natureza.
Os EUA sempre tiveram um mercado de trabalho mais desigual, heterogêneo e desregulamentado que o europeu. Apesar disso, o mercado de trabalho europeu apresentou, em todos os pós-guerras, menores taxas de desemprego e uma extraordinária dinâmica do mercado de trabalho (ampliação dos salários reais e dos salários indiretos, redução da desigualdade etc.).
A partir dos anos 80, mesmo com a maior desregulamentação do mercado de trabalho adotada em vários países europeus, não se ampliou a geração de empregos, mas, sim, a desigualdade e o empobrecimento das condições e das relações de trabalho.
Embora a globalização financeira tenha afetado o crescimento econômico mundial, os países posicionaram-se diferenciadamente diante dessa nova situação.
Os EUA dispuseram de maior liberdade, favorecida pelo poder do dólar enquanto moeda internacional. O declínio do valor do dólar "vis-à-vis" o iene e o marco, desde 1985, gerou posição competitiva privilegiada, que, somada à maior leniência do FED diante da expansão norte-americana, favoreceu um crescimento relativamente maior e mais estável.
Assim, todos os países apresentam hoje taxas de crescimento menores que no pós-guerra, inclusive os EUA. Estes, no entanto, têm taxas médias anuais relativamente maiores.
Segundo a OCDE, entre 1979 e 1995, o crescimento econômico médio anual norte-americano (2,4%) tem sido superior ao europeu (2,0%), embora representando cerca de 60% do verificado no pós-guerra (4% no período entre 1960-73). Para os mesmos períodos, a França cresceu 5,6% e 1,9% (34% do crescimento ocorrido nos anos 60) e a Alemanha, 4,5% e 2,2% (49% do crescimento anterior).
Pequenas diferenças em percentagem acumuladas ao longo dos anos podem gerar performances bastante diferentes em matéria de emprego, ainda mais se observada a dinâmica da produtividade do trabalho. Embora os países avançados apresentem hoje, paradoxalmente, taxas médias anuais de produtividade ainda menores, relativamente a países e ao período anterior.
Também segundo o OCDE, a taxa de crescimento da produtividade do trabalho norte-americana apresentou em um período recente cerca de 30% do que foi no pós-guerra (2,6% entre 1960-73 e 0,8% entre 1979-1995), contra 42% para a França (5,3% e 2,2%) e 37% para o conjunto da União Européia (5,2% e 1,9% nos respectivos períodos).
Esses dados indicam que existem outros e mais reveladores fatores associados às diferenças entre os mercados de trabalho europeu e norte-americano do que supõe a nossa vã economia.

Jorge Eduardo Levi Mattoso, 47, é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Encontra-se atualmente na França como pesquisador-visitante.

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