São Paulo, quinta-feira, 12 de junho de 1997
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A falsa quebra do BB (e outros imensos despudores)

ALOYSIO BIONDI

Deu nos jornais do dia 19 de maio último: os maiores bancos brasileiros tiveram grandes lucros no primeiro trimestre deste ano. Motivo: eles reduziram em até 80% as "provisões para devedores duvidosos", que, assim, viraram lucros em seus balanços trimestrais. Em bom português, qual o significado disso? É simples: está confirmado, como esta coluna denunciou no ano passado, que os bancos fizeram grandes manobras, com a conivência do Banco Central, para reduzir (sonegar legalmente) o pagamento do seu Imposto de Renda. Como está confirmado, também, que a "quebra" do Banco do Brasil é uma farsa montada pela equipe FHC/BNDES.
Para comprovação dessas conclusões, basta puxar pela memória:
1. A norma - Quando clientes de um banco, empresas ou pessoas físicas, atrasam o pagamento de empréstimos, o Banco Central exige que o banco lance esses valores em seus balanços, como créditos de liquidação duvidosa, e façam ainda provisões (espécie de "reserva") para cobri-los, caso eles não venham a ser pagos. Essas "reservas" são retiradas, no balanço, dos lucros do banco, reduzindo-os.
2. A manipulação - O Banco Central exige que essas provisões sejam feitas após 60 dias de atraso nos pagamentos (para créditos sem garantias; quando o devedor ofereceu garantias, o prazo pode chegar a até um ano). Estranhamente, no ano passado os bancos começaram a fazer provisões para créditos com até um dia de atraso -criando, assim, prejuízos ou redução de lucros nos balanços. Qual o objetivo desse estranho comportamento? Simples: em 1996, o Imposto de Renda dos bancos estava em 35% (mais 10% "adicionais"). Para este ano, já se sabia que ele seria reduzido para 25%. Assim, os bancos reduziram artificialmente seus lucros em 1996 (que pagariam 35% de IR), e agora estão cancelando as "provisões", aumentando seus lucros (reais) sobre os quais pagarão apenas 25% de IR.
Há muitas conclusões, importantes para o país, que a opinião pública pode extrair desses dados todos.
Banco do Brasil - A equipe FHC anunciou um rombo de R$ 8 bilhões (e, depois, mais outro, de R$ 4 bilhões) para o BB. Como esse "rombo" foi fabricado? Exatamente como os bancos privados agiram: a equipe FHC lançou como "prejuízos", como "créditos de liquidações duvidosas", bilhões e bilhões de empréstimos concedidos pelo BB. Agora, os bancos privados estão cancelando 80% das provisões, mostrando que tudo era fictício. Por que o Banco do Brasil não faz o mesmo? Porque a equipe não deixa. Quer manter o rombo "fictício", manter a farsa da quebra do BB.
E o Proer? - No ano passado, analistas alardearam que os bancos estavam com altíssimo nível de inadimplência. "Acreditaram" nos balanços manipulados dos bancos. Agora, está provado que tudo era falso. Além da sonegação (legal) do IR, a manobra provocou outro prejuízo brutal à sociedade: o governo FHC justificou o socorro aos bancos, com o Proer, alegando que a inadimplência era alta, e todo o sistema financeiro estava ameaçado. Ladainha falsa.
Despudor - 1 - Numa sexta-feira, como esta coluna registrou, o presidente da República assinou decreto mandando os bancos oficiais, como o BNDES, emprestarem às multinacionais -inclusive para que elas comprassem empresas estatais brasileiras. Três dias depois, na segunda-feira, o presidente do BNDES, em viagem a Paris, anunciou um empréstimo à Peugeot, para a instalação de fábrica no Brasil. Cinco dias depois, na quarta-feira, a empresa de energia elétrica mineira, a Cemig, fazia um leilão para "privatização parcial", com venda de um terço de suas ações com direito a voto. Vencedor do leilão: o maior grupo norte-americano do setor. Anunciou-se, na ocasião, que o BNDES iria financiar metade do valor da "compra", ou cerca de R$ 550 milhões do preço total, de R$ 1,1 bilhão. Um banco estatal, financiando um grupo estrangeiro para comprar uma estatal brasileira.
Despudor - 2 - Na última terça-feira, mais detalhes incríveis sobre a "privatização parcial da Cemig". Na verdade, o grupo dos EUA vai pagar só 25% do valor de R$ 1,1 bilhão. Os 75% restantes vão ser financiados. Detalhe: ontem, quarta-feira, esta Folha publicou os resultados do balanço da Cemig do primeiro trimestre do ano. Lucro: R$ 64 milhões. Vale dizer, em um ano, ou quatro trimestres, o lucro pode chegar a R$ 256 milhões. Isto é, tanto quanto o dinheiro que o grupo dos EUA estaria desembolsando para "privatizar parcialmente" a Cemig.
País despudorado, este Brasil de FHC.

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