São Paulo, sexta-feira, 13 de junho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo muda a lei e quer dar "um basta" a invasões

Jungmann diz que medidas devem acelerar desapropriações

WILLIAM FRANÇA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo editou ontem um pacote que busca acelerar o processo de reforma agrária e, ao mesmo tempo, inibir as invasões de terra -principal arma do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
A partir de agora, terras invadidas não serão mais avaliadas até serem desocupadas.
Isso, na prática, inviabiliza a desapropriação para assentamento de sem-terra.
As medidas foram divulgadas um dia depois da condenação de José Rainha Júnior, um dos líderes do MST, a 26 anos e seis meses sob acusação de duplo homicídio.
Há três semanas, o presidente Fernando Henrique Cardoso fez discurso pregando um "basta" ao "clima de baderna". FHC criticava principalmente João Pedro Stédile, outro líder do MST, que havia pregado a invasão de terrenos baldios para pressionar o governo.
O ministro Raul Jungmann (Política Fundiária) disse que as medidas que inibem as invasões representam "um basta do governo".
"Agora, o governo não vai mais agir sob pressão e estabeleceu regras para as desapropriações que desconectam o poder público de um delito", afirmou.
Vistoria mais rápida
O governo se comprometeu a vistoriar, em até 120 dias, as terras que podem ser desapropriadas. Até agora, não havia prazo para vistoria, o que tornava lento o processo.
Foram criados, ainda, mecanismos para tentar impedir o pagamento de indenizações superfaturadas. Aumentou de dois para quatro anos o prazo legal para que o governo tente recuperar dinheiro pago a mais em fraudes.
"É um golpe de morte em vários problemas que enfrentamos, alguns herdados do período militar", disse Raul Jungmann ao anunciar as mudanças.
Segundo ele, as medidas têm três eixos: "Golpear o conluio da indústria das desapropriações e superindenizações, descentralizar a reforma agrária e colocar de forma clara as regras para assentamento, resgatando o planejamento, desestimulando as invasões e compartilhando socialmente as decisões".
O pacote descentraliza a reforma agrária, permitindo que os Estados façam cadastramento, vistoria e avaliação de propriedades rurais. Para isso, serão firmados convênios com o governo federal.
O pacote com novas regras para a reforma agrária é composto pela MP (medida provisória) 1.577, que altera a Lei Agrária (lei 8.629/93), e pelo decreto 2.550, ambos publicados no "Diário Oficial" da União de ontem.
Metas
O ministro afirmou que as medidas (ver quadro) vão possibilitar uma aceleração no processo de assentamento, uma economia nas desapropriações e, possivelmente, um aumento na meta do governo de assentar 280 mil famílias até o fim de 98.
"Ainda não dá para calcular os efeitos, mas é a maior e a mais vasta modificação na política agrária dos últimos tempos", disse o ministro Jungmann.
Uma das primeiras economias será feita no pagamento de juros compensatórios, que hoje são de 12%, e passam a 6%, além de terem a abrangência restrita.
O ministro afirma que o Incra tem US$ 4 bilhões em dívidas, sendo que cerca de R$ 780 milhões em precatórios que devem vencer este ano. O orçamento do órgão é de R$ 2,6 bilhões em 97.
O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) chegou a relacionar os "sete pecados capitais" da reforma agrária como forma de inspirar as mudanças. São eles: avaliação para desapropriação, ação rescisória, maquiagem de terrenos e notificação, registro de projeto técnico de exploração, centralização, índices de produtividade e juros compensatórios.
Jungmann disse que as medidas estavam prontas havia meses, mas não foram anunciadas quando da marcha do MST a Brasília, no dia 17 de abril, por decisão do presidente Fernando Henrique Cardoso.
"Ele entendeu que não era o momento político correto, era melhor deixar que a sociedade visse qual a postura do MST com o governo", afirmou.
Segundo Jungmann, o governo estava aguardando sugestões dos trabalhadores rurais. "Como eles decidiram não negociar e resolveram radicalizar, o governo teve que usar de suas prerrogativas."
"Não há um golpe nos movimentos sociais. Estamos abertos à conversação. O que estamos fazendo é dar um basta na corrupção e nos conflitos agrários, e acabar com o conluio do Incra com as invasões e superavaliações de terra", disse o ministro.

LEIA MAIS sobre reforma agrária das páginas 1-5 a 1-7

Texto Anterior: Ruim de Bíblia e de geografia
Próximo Texto: Alterações na reforma agrária
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.