São Paulo, segunda-feira, 16 de junho de 1997
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A morte veio cedo para os Mummies

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Proibido se vestir como gente. Proibido gravar CDs. Proibido ficar famoso.
É quase inacreditável que uma banda de rock pudesse ter as frases acima como normas básicas de conduta.
Mas esse grupo existiu. Seu nome era The Mummies (As Múmias).
Só tocavam envoltos em bandagens, viviam mesmo como múmias ambulantes. Som: rock de garagem o mais cru e ruidoso possível.
Além de bateria, baixo e guitarra, só um tecladinho de churrascaria, que em show jamais passava da segunda música -era destruído a pontapés pelos próprios músicos da banda.
Nunca venderam grande coisa, nem ficaram conhecidos fora do circuito de surf music e garagem da região de Seattle. Mas seus poucos seguidores eram (e ainda são) absolutamente fanáticos.
"Uma camiseta dos Mummies!!" Alucinado com a descoberta casual em uma prateleira alta, nos fundos da loja Rhythm Records, em Londres, meu amigo vai abrindo alas rumo ao balcão. Quer comprar imediatamente. Também levo uma. Tudo pelo culto aos Mummies.
A banda existiu entre 1990 e 1994. Os componentes eram Trent Ruane (órgão), Russell Quan (bateria), Maz Kattuah (baixo) e Larry (guitarra). Tinham um pacto: a banda acabaria assim que recebesse um convite de uma grande gravadora.
Era raciocínio na linha "eu é que não entro para um clube que me aceita como sócio". Para os Mummies, assinar contrato com um selo importante significaria que seu som estava domesticado e, portanto, não faria mais sentido.
O convite veio, e eles não pensaram duas vezes. Acabaram com a banda.
Resta um catálogo imenso de compactos e LPs (sempre em vinil).
O melhor de todos é "The Mummies Play Their Own Records" ("Os Mummies Tocam Seus Próprios Discos"), uma bizarra experiência fonográfica.
Como muita gente reclamava que os Mummies só lançavam compactos, eles decidiram gravar um LP de modo peculiar. Pegaram os compactos, botaram em uma vitrola vagabunda e, com um gravador qualquer, registraram o que saía dos alto-falantes.
Assim surgiu o LP "Os Mummies Tocam Seus Próprios Discos".
O álbum "Fuck CD's, it's the Mummies", contém os dois maiores clássicos da banda: "Your Ass (Is Next in Line)" e "Stronger than Dirt", que abre com um verso "lírico": "Meu amor é mais forte que a lama".
"Party at Steve's House" foi o último LP com material inédito.
Existe um vídeo semipirata de um show em Nova York, que, às vezes, passa no bar Matrix, em São Paulo. O bravo jornalista Paulo César Martin, corpo e alma (principalmente corpo) do extracool "Notícias Populares", também tem uma disputadíssima cópia.
Os Mummies gravaram por uma infinidade de selos obscuros, o principal deles a Estrus. Anote: Estrus Records, P.O. Box 2125, Bellingham, WA, 98227, USA.
Se o rock é sinônimo de humor e descompromisso, então o rock se chama The Mummies.

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