São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997
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Vida profissional do paulistano piora

Datafolha mostra que 25% regrediram em 3 anos

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

Mais pessoas pioraram do que evoluíram em sua vida profissional nos últimos três anos em São Paulo: 25% regrediram, 19% melhoraram e 56% ficaram como estavam. É que mostra pesquisa Datafolha sobre as condições de vida dos paulistanos.
Para chegar a essa conclusão, o levantamento levou em conta a ocupação atual do entrevistado em comparação com a que ele tinha em 94, se ele foi demitido no período e a sua percepção sobre a renda familiar -entre outros fatores.
A constatação do Datafolha é reforçada por estatísticas oficiais, como as do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho. Os dados se referem ao mercado de trabalho formal.
Entre 1995 e 1996, foram fechados 113 mil vagas com carteira assinada na capital paulistana, principalmente empregos mais bem remunerados. O mercado está 4% menor do que em 94, embora a população em idade de trabalhar tenha aumentado nesse tempo.
Em outras palavras, não houve apenas emergentes e filas para abrir crediário nas lojas populares. Muitos pagaram a conta.
Esse é o lado mais dramático e menos conhecido das transformações socioeconômicas ocorridas no país nos últimos anos e que tiveram como matriz a "revolução do emprego", provocada pela abertura às importações.
A face positiva das mudanças também foi identificada pelo Datafolha. Graças à estabilidade dos preços e aos incentivos de crédito, o consumo -de eletrodomésticos a alimentos- melhorou para cerca de um terço dos paulistanos.
A pesquisa mostra, entretanto, que a piora nas condições de trabalho teve reflexos em outros aspectos da vida na cidade. Os hábitos de lazer dos moradores de São Paulo mudou para pior desde 1994.
Quem perdeu
O perfil de quem saiu perdendo com as transformações no mercado de trabalho mostra pessoas com escolaridade acima da média (segundo grau e, às vezes, até curso superior), mas que virou um assalariado sem registro.
Na maior parte dos casos, a renda familiar dessas pessoas não chega, atualmente, a R$ 1.200,00. Ele não tem plano de saúde e seus filhos estão na escola pública.
Segundo a pesquisa Datafolha, tudo isso repercute na sua posição política. Ele é um crítico do Plano Real e desaprova o governo Fernando Henrique Cardoso.
O confronto desses dados com as estatísticas sobre emprego indica que essas vítimas da revolução do mercado de trabalho já estiveram em melhor situação. Os dados do Caged mostram que a faixa salarial mais atingida foi a mais alta. Entre 95 e 96, cerca de 159 mil empregos que pagavam mais de R$ 600,00 por mês foram extintos em São Paulo (redução de 12%).
As profissões mais atingidas se dividem em dois grupos: as que foram atropeladas pela concorrência dos produtos importados e as que acabaram dizimadas pelos programas de enxugamento de níveis de chefia das empresas.
Assim, altos executivos e gerentes misturaram-se com metalúrgicos e tecelões na hora de pagar a conta da revolução do emprego.
Para Milton Santos, professor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo, o milagre econômico dos anos 70 produziu uma classe média subordinada à ideologia do consumo e que se esqueceu da busca da cidadania.
"É o gosto pelo médico privado, pela escola particular. É achar que, aristocraticamente, poderia se descolar do resto da sociedade. Isolou-se em bairros. Agora essa classe média está perdendo os anéis", constata.
Quem ganhou
No outro lado da balança, estão dois tipos distintos que ganharam posições no ranking social. Entre os maiores vencedores no aspecto da vida profissional está o paulistano com diploma de faculdade, renda superior a R$ 2.400,00, filho em escola particular e plano de saúde pago por si próprio.
Mas ele não está sozinho. Na hora de comprar uma nova TV ou encher o carrinho do supermercado, é mais provável encontrar um paulistano que estudou até o 2º grau, ganha de R$ 1.200,00 a R$ 2.400,00 e tem plano de saúde pago pela empresa.
É um afluente típico. Com baixa inflação, faz seu salário render mais e consome mais. Isso porque ele é, em geral, assalariado com carteira assinada.
A informalidade das relações trabalhistas, traduzida em "terceirização" e contratação de empregados autônomos, muitas vezes não registrados, mostrou-se inimiga da melhoria das condições profissionais dos paulistanos.
O professor Santos é otimista sobre o desfecho dessa transformação. Para ele, o fato de haver "decadentes" de classe média vai provocar a reavaliação do processo: "Teremos uma discussão mais consequente sobre emprego, educação, saúde e vida coletiva".

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