São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997
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Parte da classe média "perde os anéis"

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

A classe média sente que está perdendo os anéis. Ou pelo menos uma parte dela. Essa é a principal conclusão de uma pesquisa qualitativa ainda inédita realizada pelo Instituto Opinião no final de 1996 com paulistanos de 25 a 45 anos.
As frases ditas nas discussões em grupo, transformadas em relatório pela pesquisadora Raquel Moreno, revelam a angústia de pessoas teoricamente de classe média diante da dificuldade de manter seu padrão de vida.
"Quando entrei na sala de aula e vi meu filho ali, no meio daquilo tudo, me deu um aperto no coração. Ele é inteligente, esforçado, merecia a escola particular", diz uma mãe que teve que transferir o filho para a escola pública.
Escola particular
Esse é um dos aspectos da transformação pela qual uma parcela da população do que se costuma chamar de classe média está passando diante da revolução do mercado de trabalho.
Não há números precisos, mas diretores de escolas particulares afirmam que tem havido a transferência de alunos das escolas mais caras para as mais baratas e a ida de estudantes das particulares mais baratas para as públicas.
A pesquisa qualitativa, como o próprio nome indica, não pretende medir a quantidade de pessoas que são atingidas por um certo fenômeno. Ela tenta captar o que essas pessoas pensam e como elas reagem às transformações.
Foi a partir do relatório do Instituto Opinião que o Datafolha montou a sua pesquisa para quantificar o número de paulistanos que estão passando por mudanças em suas condições de vida por causa de mudanças da economia.
Problemas financeiros
Embora o número de pessoas com filhos em escola particular seja pequeno em relação à população, a pesquisa Datafolha mostrou que metade dos pais que precisaram tirar o filho da escola particular o fizeram nos últimos três anos.
Sobre o motivo pelo qual mudaram os filhos para a escola pública, 58% disseram que era devido a problemas financeiros.
Plano de saúde
A educação dos filhos, entretanto, não é a única angústia de quem está perdendo qualidade de vida. "Eu só tenho plano de saúde para mim. O marido e o filho terão que esperar. Precisava por causa da gravidez", diz uma entrevistada.
A pesquisa Datafolha mostra que não houve alteração significativa no percentual de paulistanos com plano de saúde (43%). Mas houve uma mudança de perfil.
Aumentou a parcela de pessoas que pagam o convênio do próprio bolso e diminuiu o percentual dos que têm o plano pago pela empresa onde trabalham. Uma das explicações para o fenômeno é a crescente "terceirização" dos funcionários. Uma vez autônomos, eles perdem os benefícios que tinham quando assalariados.
Isso está afetando a contabilidade dos planos. Segundo o sindicato da categoria, a inadimplência dos clientes aumentou.
Na apresentação de seu relatório, Raquel Moreno escreve que sua primeira constatação foi a crise de identidade da classe média.
O critério de classes A, B, C, D e E (centrado na posse de eletrodomésticos e nível de instrução), diz ela, "confunde o pesquisador ante o aumento do poder aquisitivo das classes mais baixas".
"A fronteira mais baixa da classe tornou-se permeável, permitindo uma queda dos que ali se mantinham a duras penas -professores, bancários-, e absorvendo a ascensão de prestadores de serviços que os novos tempos tornaram mais solicitados", escreve.

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