São Paulo, quinta-feira, 26 de junho de 1997
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Zé Celso mostra peça 'bem-comportada'

DANIELA ROCHA
ENVIADA ESPECIAL A ARARAQUARA (SP)

Sem a nudez anunciada, sem palavrão, sem imoralidades, "Ela", adaptação do texto de Jean Genet encenada na abertura da 9ª Semana Luis Antonio, anteontem em Araraquara, foi a resposta em forma de teatro dada por Zé Celso e sua companhia Uzyna Uzona aos obstáculos impostos à sua vinda.
Cerca de cem pessoas ocupavam alguns dos 450 lugares do Teatro Municipal da cidade. Nenhum representante oficial do prefeito Waldemar De Santi (PPB) ou da Fundart (Fundação de Arte e Cultura), órgão municipal de cultura, foi conferir a primeira noite de Zé Celso em Araraquara (282 km de São Paulo).
O público que viu aplaudiu de pé o espetáculo e saiu questionando a razão de tanta polêmica (leia nesta página).
"Ela", encenado apenas uma vez em São Paulo, durante o evento "Babel", no início do mês, foi apresentado sem ensaio no palco do Teatro Municipal de Araraquara.
Como o teatro fica fechado à noite -período em que os atores fariam um ensaio geral-, durante o dia houve tempo apenas para afinar a luz, montar cenário e organizar os figurinos -a direção de arte foi assinada por Gringo Cardia e contou com figurinos de escolas de samba do Rio de Janeiro.
Papa
A apresentação durou cerca de duas horas. "Ela", na adaptação do texto de Jean Genet, é Sua Santidade, o papa João Paulo 2º. A peça traz a história da aguardada chegada do papa para a pose oficial da foto que seria distribuída a 15 milhões de fiéis no mundo todo. Uma imagem tão forte que sozinha seria capaz de converter os infiéis.
Zé Celso interpretou o papa que seria registrado pelo fotógrafo judeu Etiénne Levy (interpretado por Fransérgio).
"Pra Dar um Fim no Juízo de Deus", peça que Zé Celso e sua companhia apresentariam ontem em Araraquara, teve um ensaio inusitado. Os atores usaram o restaurante Degraus como palco para a passagem de texto.
Durante uma hora, eles correram o espaço encenando, cantando e filmando em vídeo.
"Pra Dar um Fim no Juízo de Deus" é uma adaptação da peça radiofônica de Antonin Artaud gravada em 1948 e proibida de ir ao ar pelo governo francês.
Em trecho da peça, diz Artaud: "Quando vocês tiverem feito um corpo sem órgãos, vão ter libertado o homem de todos os seus automatismos e terão devolvido sua verdadeira e imortal liberdade. Aí vocês poderão lhe reensinar a dançar pelo avesso como na loucura das danças de rua. E esse avesso será seu verdadeiro direito".
O texto trata da existência do corpo a partir de fezes, esperma e sangue, usados em cena.
Polêmica
Zé Celso queria apresentar "Bacantes" no Teatro de Arena da cidade, durante a Semana Luis Antonio, que homenageia seu irmão, morto há dez anos. Mas ele havia sido impedido pela presidente da Fundart, Maria Martha Lupo Stella, que "não considerava oportuna" a ida do diretor à cidade.
Lupo Stella considerou conveniente prevenir novos escândalos. Em 1995, Zé Celso e seis atores foram denunciados com base no artigo 208 do Código Penal, de vilipendiar (ofender) ritos religiosos durante a apresentação da peça "Mistérios Gozosos" na cidade.
O caso está sendo avaliado no Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.

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