São Paulo, segunda-feira, 30 de junho de 1997
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Seguros: os sinistros estão crescendo mais

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Ao longo de todo o ano de 1996, a atividade seguradora praticamente não cresceu. Com uma diferença de menos de R$ 1 bilhão no volume de prêmios arrecadados durante todo o ano, mal e mal o seu faturamento atingiu os R$ 16 bilhões, o que, em comparação com 1995, é praticamente nada.
As causas desse desempenho medíocre, depois de dois anos de crescimento acelerado, são fáceis de explicar. Encontram resposta, basicamente, na queda de quase 30% no preço dos seguros de automóveis, que não foi compensada pelo crescimento das carteiras de vida, saúde e previdência privada.
De acordo com os números divulgados pela Superintendência de Seguros Privados, Susep, sobre o desempenho do setor nos primeiros meses deste ano, o mercado voltou a crescer, com os prêmios apresentando um desempenho 20% acima do seu equivalente há um ano.
Seria um resultado para comemorar, especialmente vindo logo após a chegada de várias companhias estrangeiras dispostas a ingressar no mercado brasileiro em função do seu grande potencial de crescimento.
Todavia esse número precisa ser lido com cuidado e dentro de um contexto maior, que, infelizmente, traz um outro número bastante ruim para as seguradoras. Os sinistros estão crescendo mais do que os prêmios.
Isso quer dizer que o crescimento do mercado não está sendo saudável para ele e que a produção nova, em vez de melhorar-lhe o desempenho, que já não foi grande coisa no ano passado, está agravando um quadro que pode vir a ser sério para várias empresas.
Uma seguradora é uma grande gestora de poupança, representada pelos prêmios pagos pelos segurados em troca da proteção garantida por ela, no caso de acontecer um sinistro coberto por uma determinada apólice.
Conceitualmente, os prêmios deveriam se destinar a finalidades específicas. Vale dizer, os prêmios dos seguros de automóveis deveriam ser utilizados para fazer frente aos sinistros de automóveis, os de incêndio fariam frente aos sinistros de incêndio, e assim sucessivamente.
Na prática, não é isso o que ocorre. A seguradora constitui as reservas para fazer frente aos seus riscos, mas não há uma individualização tão detalhada que dirija os prêmios de cada carteira para arcar com seus sinistros específicos.
Aliás, isso seria um absurdo, já que uma carteira de baixa sinistralidade pode gerar o excedente de prêmio necessário para que a seguradora arque com as indenizações de uma carteira de alta sinistralidade, sem compreender o seu desempenho operacional, garantindo a segurança dos segurados e a remuneração dos acionistas.
Todavia existem situações em que essa fórmula não pode ser aplicada. A mais evidente delas é a que separa completamente os seguros de bens e responsabilidade dos seguros de pessoas.
Não há como pretender utilizar o prêmio dos seguros-saúde para fazer frente às indenizações dos seguros de automóveis. São duas categorias de seguros que não podem se misturar, inclusive porque os seguros-saúde, em função das carências, têm sempre uma entrada muito rápida de dinheiro para uma entrada muito mais lenta dos sinistros, que, por sua vez, se acumulam ao fim destas.
Usar esse dinheiro para pagar os prejuízos da carteira de automóveis -que está com o preço baixo em função de "dumping" e dimensionamento errado dos custos dos sinistros, que estão crescendo numa velocidade inesperada- é um verdadeiro suicídio, que não pode ser cometido pelos administradores das seguradoras nem permitido pela Susep.
E a mesma regra se aplica para os seguros de vida individual e para os planos de previdência privada. Esses produtos, pelo seu sistema de capitalização, não podem ter o dinheiro gerado pelos seus prêmios utilizado em nenhuma outra atividade da companhia, exceto para fazer frente aos custos administrativos e comerciais diretamente gerados por eles.
Utilizar os seus valores para outra finalidade é roubar o segurado, já que o proprietário dos fundos é ele e não a seguradora. A seguradora, como já foi dito acima, não passa da gestora de fundos que, de verdade, não são seus, mas sim de seus clientes. Estes, pelo pagamento dos prêmios, criam os mútuos necessários para fazer frente aos seus sinistros.
Com os sinistros crescendo mais do que os prêmios, o que vai acontecer é que o índice combinado de um bom número de companhias, que já estava ruim, vai ficar pior, obrigando as seguradoras a conseguir altas taxas de remuneração para as suas aplicações.
Como em todas as frentes -inclusive nas Bolsas, que já tiveram um crescimento excepcional ao longo do primeiro semestre- essas taxas estão em queda, é indispensável que o mercado se reposicione rapidamente, revendo suas políticas comerciais, antes que as dificuldades de caixa que certamente atingirão mais de uma empresa comprometam a credibilidade de todo um setor econômico que, ao longo dos últimos anos, tem experimentado uma situação positiva única em toda a sua história.

E-mail: pentmend@dialdata.com.br

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