São Paulo, quinta-feira, 3 de julho de 1997 |
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Desprezo pelo romantismo incomoda
CÁSSIO STARLING CARLOS
Realizado em 1975, esse primeiro filme de Serge Gainsbourg, que dirigiria depois três outros longas, traz a marca de sua época e funciona como um desafio estético e moral para os padrões atuais. A cena inicial mostra um casal de caminhoneiros gays se acariciando enquanto leva uma carga de lixo para um depósito. Um corvo se espatifa contra o pára-brisa, e seu sangue escorre pelo vidro. Para Gainsbourg, não há glamour nem romantismo a defender. Trata-se de um "amor físico", e este é "sem saída". Sua fábula gay é pura transgressão. Afinal, estamos em 1975, época em que a homossexualidade estava condenada à existência marginal. A aparição de Johnny, uma garota -Jane Birkin- que trabalha num bar de beira de estrada, introduz um terceiro elemento na relação homossexual. Ela se parece com um garoto, veste-se como tal e desperta o desejo do caminhoneiro por causa disso. Um exemplo da má intenção do diretor está em uma cena na qual Johnny aparece de vestidinho rosa e provoca a ira de seu amante. Seja o amor homo ou heterossexual, na visão de Gainsbourg, o romantismo é seu veneno. Daí o grande incômodo que o filme pode causar nas platéias de hoje, acostumada a visões róseas do desejo. A beleza de "Paixão Selvagem" vem daí, dessa provocação "involuntária". Mas há também cinema aqui, de um tipo não mais praticado, em que o provisório estampa a todo momento sua marca. As imagens de Gainsbourg parecem inacabadas, toscas. O erotismo jamais é maquiado para excitar a platéia, e a beleza, quando emana, é bruta. O avesso da afetação estética em que depois se especializou o cinema francês. (CSC) Texto Anterior: A LETRA Próximo Texto: Molière critica a hipocrisia humana Índice |
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