São Paulo, sexta-feira, 4 de julho de 1997 |
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'Johns' une anônimos em busca de uma nova vida
AUGUSTO MASSI
Para um garoto de programa, dormir sozinho significa não trabalhar. Para John, representa o único momento de repouso que antecederá um dia infernal. Na cena seguinte, assistimos a alguém roubar o seu tênis da sorte e todo o dinheiro que escondia dentro. É véspera de Natal, véspera de seu aniversário, e John esperava com aquele dinheiro realizar um sonho há muito acalentado: passar a noite no Park Plaza Hotel, um dos mais luxuosos da cidade. Vai ter que recomeçar do zero para atingir os 300 dólares necessários. Daí para frente tem início uma peregrinação interminável. Mas o foco dramático, que parece empenhado em retratar a vida de um garoto de programa, adquire uma nova textura. John só reconhece como digno de seu afeto a figura entre ingênua e angelical de Donner (Lukas Haas), com quem, depois de frustrada a realização de seu sonho, planeja viajar para Camelot. Nesse sentido, é um filme que repensa a utopia da amizade. John e Donner são dois cavaleiros. A mitológica cidade do rei Arthur é mais uma das citações que aludem à idéia recorrente de começar uma vida nova. Por sinal, é justamente no trabalho dos atores, David Arquette e Lukas Haas, que encontramos o ponto alto do filme. "Johns" conta ainda com uma magistral participação de Elliot Gould, no papel de Manny, um homossexual casado e com filhos. É no título "Johns" que devemos buscar o argumento principal. Para além da referência explícita aos diferentes personagens que cruzam o caminho de John, essa duplicação do nome (no original em inglês,"Johns, Johns") sinaliza a ênfase à semelhança massificada do anonimato. Com o primeiro John que aparece, ele divide literalmente o pão; com o segundo, um cliente de primeira viagem que se chama ironicamente John Wayne, não sabemos quem é o mais lesado; com o terceiro, para quem John declara ser este o último programa de sua vida, compartilha uma dança. Talvez resida nessa leveza a maior qualidade do filme. As cenas que deveriam chocar são tragadas pela fluência narrativa que contorna com habilidade o clichê realista da violência e do sexo. Porém parece faltar a "Johns" uma perspectiva pessoal capaz de levar até o fim a constelação de forças que só vislumbramos de forma embrionária. Scott Silver, assim como seu personagem, ainda está filmando a véspera. Ao que tudo indica, o melhor virá amanhã. Filme: Johns Produção: EUA, 1996 Direção: Scott Silver Com: Lukas Haas, David Arquette Quando: a partir de hoje, nos cines Paris e Belas Artes - sala Aleijadinho Texto Anterior: Cidade foi criada por computador Próximo Texto: Alberto Dines estréia coluna na Ilustrada Índice |
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