São Paulo, domingo, 6 de julho de 1997
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Mãe viajante não teme "largar" família

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Colocar a profissão em primeiro lugar é complicado para uma mãe de família, especialmente quando esse lugar é longe. No caso das mães que trabalham viajando pelo mundo, têm de ter fôlego de gato.
"Quando viajo, é como se eu morresse aqui e nascesse no lugar onde eu chego. Na volta, idem. Não posso estar lá com a cabeça aqui e vice-versa", diz a empresária Angelika Winkler, 48, há 23 trabalhando com comércio exterior.
Angelika está casada há 25 anos, tem dois filhos, de 22 e 18, e, desde que eles eram crianças, viaja durante praticamente seis meses por ano (juntando tudo).
Mesmo quando os filhos dela eram bebês, Angelika viajava tranquila. "Não tinha culpa de deixá-los. Acho que a presença constante nem sempre é sinônimo de qualidade no relacionamento."
Quando a filha mais velha dela tinha 4 anos, Angelika a levou para a Europa. "Levei-a pra mostrar aonde a mãe dela ia quando desaparecia", explica.
Além das viagens de negócios, Angelika ainda "desaparece" para "estudar". "Vou muito ao Oriente, para entender melhor o xamanismo (doutrina que leva ao autoconhecimento por meio de ritmos e elementos da natureza)."
O marido dela, que é antiquário e também costuma viajar a trabalho, prefere, quando a viagem é de lazer, ficar no Ocidente.
"Meu marido também tem o espírito livre, o que é bom e ruim. Claro que já tive surpresas desagradáveis", diz ela (leia depoimento ao lado).
Não eram surpresa as notícias que aguardavam a guia turística Arlete Godoy, 51, quando ela vinha de viagem.
"Sempre soube que meu marido tinha outras, mas isso não tem nada a ver com a minha profissão", acredita Arlete, que foi casada durante 25 anos, tem três filhos e viaja mais de seis meses por ano.
"Qualquer mulher que trabalha tem mais dificuldade de manter um casamento estável. Só a que fica em casa e não tem acesso à informação não oferece riscos."
Na verdade, as viagens de Arlete contribuíram para o casamento dela durar mais, e não menos.
"Meu marido ia me levar ao aeroporto feliz da vida. Dava a maior força para eu ir, me despachava mesmo", lembra.
Arlete diz que também se apaixonou algumas vezes. "Claro que me envolvia nas viagens. Chegava a lidar com 300 pessoas em apenas um mês viajando", conta.
Ela afirma que seus filhos, apesar de ficarem com o pai, sempre foram mais ligados a ela.
"O pai era mais ausente do que eu, estando sempre ali", afirma .
"Até para consertar uma torneira meus filhos me esperavam. Eu sempre fiz questão de estar muito próxima deles. Ligo todo dia."
As três filhas da comissária de bordo Walkyria Augusta Natale, 39, 25 de profissão, cerca de dez meses fora de casa por ano, estão prestes a ter uma experiência que nunca tiveram na vida -a mãe em casa. "Até o fim do ano eu me aposento", diz Walkyria, que é chefe de equipe de primeira classe.
Para as crianças (de 16, 12 e 10 anos) pode ser ótimo, mas, para ela, não se sabe. "Adoro voar. Não sei se vou me acostumar em casa."
O marido de Walkyria, segundo ela, integra o coro pela sua volta para casa. Ela diz que, ao contrário do que se imagina, marido de aeromoça não tem sangue de barata.
"Ele é ciumentíssimo. E eu também", conta. Apesar disso, Walkyria diz que ele nunca pediu que ela deixasse de voar. "Ele sabia que minha profissão estava em primeiro lugar."

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