São Paulo, quarta-feira, 9 de julho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tele Sena carimbada

JOSÉ CARLOS TONIN

Não é capitalização. É jogo camuflado. Lesa o consumidor e os Correios. Essa é a síntese da sentença prolatada pelo juiz João Batista Gonçalves da 6ª Vara Federal de São Paulo, nos autos da ação popular que movo há cinco anos e na qual ele anulou o ato administrativo da Susep (Superintendência de Seguros Privados), que autorizou a Liderança Capitalização S/A a emitir cartelas de jogo travestidas de título de capitalização.
Também foram considerados lesivos à União os contratos de comercialização dessas cartelas pelos Correios a custo irrisório.
Para o magistrado, a Tele Sena foi adaptada para ser vendida às classes menos favorecidas, sob a forma de loteria e com valor de devolução reduzido à metade, após um ano de desembolso. Com pequena capacidade para poupar, as classes menos favorecidas adquirem a Tele Sena, iludidas por uma propaganda malsã e enganosa.
Autorizada a vender esse jogo por um funcionário de terceiro escalão do governo Collor, por simples ato administrativo e não por lei, a Liderança vem fazendo a festa à custa do desprotegido poupador popular desde 23/8/91, abusando da veiculação de propaganda em canal de TV do mesmo grupo e também a custo ínfimo.
Nesses cinco anos e meio, ela já vendeu mais de 1,7 bilhão de cartelas, um papel que um ano depois de comprado vale metade de seu valor em face. De um faturamento total de cerca de R$ 3 bilhões, perto de R$ 300 milhões já foram para os bolsos da pessoa física Silvio Santos, sem dúvida o garoto-propaganda mais caro do mundo e que é remunerado por ele mesmo, já que é o dono da Liderança. Restou provado que a Tele Sena é um engenhoso artifício montado com suporte na omissão e benevolência dos antigos e atuais dirigentes da Susep, sob a roupagem de capitalização, para aliviar os bolsos de depauperados hipossuficientes.
O sábio juiz João Batista Gonçalves debruçou-se sobre as 1.400 páginas dos autos e desmontou a farsa, deixando a administração federal à vontade para suspender essa ilícita jogatina, um verdadeiro estelionato praticado à revelia do artigo 5, inciso 32, da Constituição: "O Estado promoverá na forma da lei a defesa do consumidor".
Precisam ser coibidos os desmandos administrativos que deixaram essas instituições financeiras livres para se apossarem das parcas economias de milhões de desesperançados que a cada concurso ficam mais pobres. Eles nada ganham, participando dessa promoção ilusória, imoral e inconstitucional que a Liderança engendrou para mais se locupletar, sob as vistas complacentes das autoridades. O Judiciário fez a sua parte: carimbou a Tele Sena. Que ajam as autoridades competentes, o Ministério da Fazenda e a Superintendência de Seguros Privados.

Texto Anterior: Prêmio Jabuti tem selecionados
Próximo Texto: SP investe em nova técnica para despoluir rios Tietê e Pinheiros
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.