São Paulo, quinta-feira, 17 de julho de 1997
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Intimista, Byrne se rende à eletrônica

PAULO VIEIRA
ENVIADO ESPECIAL A MONTREUX

David Byrne é um homem ocupado neste verão europeu. Tocou anteontem na 12ª noite do festival de Montreux, exibe-se hoje e amanhã na Finlândia e volta à Suíça no domingo, onde é a principal atração do Gurten Festival, em Berna.
Ele acabou de lançar "Feelings", seu sétimo disco desde sua saída dos Talking Heads, cuja volta ele diz, taxativamente, ser impossível.
"Feelings" é recheado de colaborações inusitadas, como o grupo inglês de trip hop Morcheeba e Joe Galdo, produtor de Angélique Kidjo e ex-colaborador do Miami Sound Machine de Glória Estefan.
O show preserva o conceito de "Feelings". Samplers, bateria eletrônica, pedais. Com mais quatro músicos e tal aparato, contudo, ele conseguiu soar, ao menos em Montreux, intimista.
Após o show, enquanto Me'Shell tomava seu lugar no palco, Byrne recebeu a Folha no "backstage" para uma entrevista exclusiva. Falou de samples, seu divórcio com os Talking Heads, Chico Science e Virgínia Rodrigues.
*
Folha - Por que você começou seu show com "Once in a Lifiteme" e terminou com "I Zimbra", ambas músicas dos Talking Heads?
David Byrne - Achei bom começar com canções dançantes. Meu disco novo também tem, mas ainda não são tão conhecidas.
Folha - Tendo tanto interesse em world music, é fácil definir o que quer em seu próprio disco?
Byrne - Não. O problema muda de música para música e de disco para disco. Em "Feelings" eu escrevi "Miss America". Quando eu usei a loop, percebi um som que parecia um violino sintetizado. Eu achei bom, porque aquilo soou como música cubana.
Mas foi uma casualidade. Pensei em como traduzir aquino numa techno-salsa, fazer soar como salsa, mas mais contemporâneo.
Folha - Você mantém relações com os outros Talking Heads?
Byrne - Não. Eu não os vejo há anos. Nós tivemos brigas, um divórcio. Eu penso que é mais fácil para músicos de jazz manter uma carreira solo e ao mesmo tempo um grupo. Fazem projetos diferentes, reagrupam-se. Um grupo pop é diferente. Tem mais coisas do que apenas interação musical.
Folha - Qual foi exatamente o problema entre você e os outros?
Byrne - Uma série de pequenas coisas. Questões de criação, pessoas que não estavam felizes, pessoas se drogando, tudo isso.
Folha - É impossível para você voltar aos Talking Heads?
Byrne - Sim, é impossível.
Folha - Você cita Chico Science em sua homepage. Poderia falar algo sobre ele?
Byrne - Claro. Antes dessa tragédia, ele e seu grupo não estavam tendo muito apoio da Sony. Eles fizeram sucesso sozinhos. Trabalharam incrivelmente duro.
Vieram fazer shows na América e Europa quase por conta própria, sem apoio da gravadora. E nós amamos eles. Falava para as pessoas ouvirem. Ele representava algo novo na música brasileira.
Os elementos do rock estavam lá, mas também os tambores do maracatu. A maneira como ele juntou isso, seus textos, letras, a atitude, tudo isso fez dele algo novo. Não foram esses elementos que o fizeram novo, mas a maneira como conseguiu juntá-los.
Eu penso que estão acontecendo coisas na América do Sul e outros continentes. Essa geração toda tem um certo tipo de telepatia. Todos fazem coisas similares. Usam ritmos, sons, psicodelia, rap, mas sempre cantando sobre temas contemporâneos.
Folha - Está acontecendo algo novo nos EUA, o seu país?
Byrne - Não sei. Em Nova York, há algo chamado ambient. É um tipo de mistura de jungle, samples, ambient, experimentalismo.
Folha - Como vão as vendas de Tom Zé em seu selo?
Byrne - Ele não vende muito, mas as pessoas se sentem inspiradas pelo que ele faz. De alguma forma ele é uma enorme influência. Tenho falado com Caetano (Veloso) sobre Virgínia (Rodrigues). Não sei o que acontece. Não vi sou show, mas ouvi seus tapes. É incrível, senti algo diferente logo na primeira vez que ouvi. É bonito, mas é muito estranho.

O jornalista Paulo Vieira viaja a convite da EMI, PolyGram, WEA e Tag Heuer

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