São Paulo, segunda-feira, 28 de julho de 1997
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Longa vida à alquimia pop do Radiohead

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Pô, Beavis, sua anta, quando é que chega a parte cool?"
"Peraí, Butt-Head, já vai começar. Olha lá, olha lá, começou!"
"Rock, rock, rock!!!"
Você deve se lembrar deste trecho de um episódio de Beavis and Butt-Head. É mais ou menos o que eles dizem ao ver o videoclipe de "Creep", o primeiro (e muitos apostavam que seria o último) sucesso da banda inglesa Radiohead.
"Creep" seguia uma fórmula que se pode chamar de grunge melódico. Começava lenta e ia descendo até explodir num refrão movido a zilhões de guitarras.
A música era de tal modo pungente e pop que, dizia-se, o Radiohead nunca conseguira se livrar desse fantasma.
É mais ou menos o que enfrenta hoje o Nada Surf, curvado sob o peso da maravilhosa "Popular".
Mas o Radiohead tem no comando um visionário, Thom Yorke, e lançou há dois anos um segundo álbum, "The Bends", para calar os céticos. Ainda cravou outro hit, "Ironlung".
Em "The Bends", Yorke firmou-se como delicado arquiteto de texturas e canções. E transformou o Radiohead numa daquelas bandas admiradas principalmente por outras bandas, tão reluzente é seu talento como compositor.
Até o habitualmente venenoso Ian McCulloch, líder do Echo and the Bunnymen, cita o Radiohead como um grupo acima do bem e do mal.
Agora, o planeta treme sob o impacto de "OK Computer", terceiro e mais recente disco do Radiohead.
Em 1997, Yorke leva a complexidade de suas composições ao ápice. Cada faixa abriga na verdade várias canções. São pequenos efeitos, cordas, guitarras de sonoridades bizarras, ruídos, letras delirantes.
O que, numa análise apressada, poderia nos sugerir que o rock progressivo estaria de volta.
Mas não é nada disso, pelo menos se depender do Radiohead.
Porque, antes de tudo, Thom Yorke tem os dois pés fincados no rock ("Creep" seguia a estética grunge, ou pelo menos a contrafação britânica dela). E a música do Radiohead, por mais que pareça pomposa, é ironia pura.
Basta uma olhada no site do Radiohead na Internet para notar que eles não se levam muito a sério. Logo de cara, uma suposta pesquisa com fãs da banda mostra que a música mais lembrada é "Creep", seguida de "Ironlung" e "Losing My Religion" (detalhe: esta última é do R.E.M.).
O rock progressivo de monstrengos como Pink Floyd, Yes e Genesis tinha ódio do rock e vontade de ser música clássica. Esperava ser levado a sério, achava que mudaria a face da música.
O Radiohead é difícil, sofisticado, mas pop até a raiz.
Longa vida ao Radiohead. E morte definitiva ao som progressivo.

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