São Paulo, sexta-feira, 1 de agosto de 1997 |
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Hemingway não resiste em 'No Amor e na Guerra'
MARCELO REZENDE
Em meados da década de 10, quando era apenas mais um garoto sonhador do interior dos EUA, Hemingway, o futuro fantasma a ser combatido -ou idolatrado- na literatura norte-americana, ainda recém saído da adolescência, chegou à Europa para participar da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Suas aventuras -militares e amorosas- talvez hoje servissem apenas a fanáticos. Isso se o escritor não as tivesse transformado em romance, no livro "Adeus às Armas" (1929). Na obra, o escritor -o herói da prosa direta e limpa- narra o desejo avassalador de um soldado, vindo da América, por uma enfermeira. Uma história que rapidamente foi reconhecida como um disfarce desajeitado do relacionamento de Hemingway com Agnes von Kurowsky, a mulher que cuidou de seus ferimentos em Milão. O interesse de Attenborough não está, na verdade, na versão contada por Hemingway em seu romance, ou na de seus amigos poucos discretos, mas na da de Agnes. Seu "No Amor e na Guerra" é uma adaptação do livro "Hemingway in Love and War", que traz cartas de Agnes ao escritor e também os diários sobre o relacionamento que tiveram. A intenção, de início cativante, é tentar contar um surrado episódio na vida de um notável do ponto de vista contrário, à maneira de um espelho. E Hemingway, escritor de talento indiscutível e mentiroso compulsivo, serviria de forma exemplar a essa revisão. O filme, então, estaria em uma curiosa mistura de planos, onde há o personagem real -famoso por fazer fantasia de fatos- visto agora sob um olhar supostamente mais "verdadeiro" (o da enfermeira), que se submete, ainda, às regras e esquemas de uma ficção cinematográfica. Mas, claro, estamos no mundo de Attenborough. Isso significa converter em nulidade qualquer grande possibilidade, desfazer com a mão esquerda o que é construído com a direita. Em seu cinema, (como em "Gandhi") uma vida -e ele parece adorar a "biografia dos grandes"- interessa menos do que a chance de transformá-la em um grande folhetim, que se afoga no tom esquemático e na rasa dimensão de seus personagens. Hemingway é um dos grandes mitos da cultura norte-americana deste século, cultuado tanto por sua obra quanto por suas ações: a de um homem que adorava mulheres, conflitos e literatura. Parece risível, então, ter o ator Chris O'Donnell usando suas fardas e falas, com Sandra Bullock, um atriz que é um mistério (não é excepcionalmente bela, talentosa ou carismática para justificar sua fama), fazendo o contraponto romântico. Tudo em "No Amor e na Guerra" comprova, por fim, uma suspeita sobre seu diretor. Não se trata apenas de falta de talento, mas também da desonestidade de alguém que procura mascarar um raso comercialismo. Filme: No Amor e na Guerra Produção: EUA, 1997 Direção: Richard Attenborough Com: Chris O'Donnell, Sandra Bullock Quando: a partir de hoje nos cines Paulistano, Eldorado 6 e circuito Texto Anterior: "O Último Jantar" ri do idealismo político Próximo Texto: Contos são reeditados Índice |
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