São Paulo, domingo, 3 de agosto de 1997
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Ondas de rádio tratam insônia

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DE NOVA YORK

Um inventor criou um aparelho que está intrigando pesquisadores de neurociências e de doenças do sono nos Estados Unidos.
Desenvolvida pelo suíço Boris Pasche, da empresa Syntonic, a engrenagem promete reduzir a insônia, que afeta hoje cerca de 30% da população norte-americana.
Com formato de uma colher, o instrumento deve ser colocado na boca do paciente com o problema a noite toda. Ativado, o aparelho passa a emitir ondas de rádio de pequena intensidade, que restaurariam o sono natural.
Além dos experimentos realizados pelo próprio cientista suíço, sua invenção foi testada por clínicas independentes de três diferentes Estados norte-americanos.
Pesquisadores das cidades de Denver, Detroit e San Diego colocaram a engrenagem em 152 pessoas que sofrem de insônia.
Em média, as 152 pessoas analisadas que dormiram com a "colher" pegaram no sono 20 minutos antes do que quando tentavam dormir sem ajuda alguma.
Eles dormiram também cerca de uma hora a mais do que quando estavam sem o aparelho.
Segundo declarou o inventor suíço à revista "New Scientist", as vantagens sobre as pílulas para dormir são enormes.
Ele admitiu que, com as pílulas, as pessoas podem "apagar" mais rapidamente, mas lembrou que elas inibem o sono mais profundo, o que não acontece com seu aparelho.
Outro ponto favorável para a invenção de Pasche é o fato de que, segundo os testes já realizados, não houve efeitos colaterais, como costuma acontecer com algumas pílulas para dormir.
O inventor disse ainda que as ondas de rádio estimulam a produção de sonhos e o "sono REM" (sigla em inglês para Movimento Rápido dos Olhos), uma fase do sono que marca intensa atividade cerebral.
Modo de usar
Antes de iniciar a comercialização do aparelho, pesquisadores tentam apontar a melhor maneira de usá-lo.
No princípio, o paciente não precisa usá-lo a noite inteira. No caso das 152 pessoas analisadas, porém, elas ficaram com o aparelho durante todo o período em que estiveram na cama.
Mais tarde, essas pessoas foram submetidas a uma nova bateria de testes. Nesse caso constatou-se que, ficando com a colher apenas durante meia hora, o efeito obtido é semelhante.
Em outras experiências comandadas por Pasche, mas ainda não confirmadas por outros laboratórios, mesmo que coloquem a "colher" na boca por cerca de uma hora no período da tarde, a qualidade do sono à noite é melhor.
Dúvidas
Estudiosos de neurociências e distúrbios de sono entrevistados pela Folha acham prematuro dizer que o pesquisador suíço tenha descoberto uma "cura", mesmo que parcial, para a insônia, que só na cidade de Nova York afeta cerca de 3 milhões de pessoas.
Eles dizem que não há explicação científica para o fato de as ondas de rádio terem minorado o problema da insônia em pessoas que sofrem do mal.
Pelo simples fato de acreditarem que estão sendo tratados, os pacientes podem relaxar naturalmente e, por isso, dormir melhor.
Teorias
A explicação para a possível utilidade das ondas de rádio no combate à insônia também diverge entre especialistas.
Um dos principais problemas, que incentiva quatro dos 12 entrevistados a acreditarem no "efeito placebo", é o fato de as ondas do aparelho serem quase mil vezes mais fracas do que as "normais".
Segundo eles, não seria possível que as células cerebrais detectassem as ondas transmitidas pelo aparelho.
Pasche, no entanto, rebate os comentários dos que se opõem a seu experimento, sugerindo que as ondas otimizam a ação dos neurotransmissores, facilitando o relaxamento cerebral.
Uma possibilidade, no entanto, levantada por um dos 12 pesquisadores entrevistados é que as ondas estimulariam a produção de melatonina, que tem como uma de suas funções regular o sono.
Os outros 11, no entanto, discordaram dessa possibilidade.
"No começo eu estava cético", disse Thomas Roth, do Hospital Henry Ford, em Detroit.
"De qualquer forma, há indicações de que o campo eletromagnético tem alguns efeitos biológicos e é eficaz no tratamento da insônia em algumas circunstâncias."
A explicação científica para o processo, porém, Roth também não soube dar.

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