São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 1997
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Portugal chega com 'novos talentos'

BERNARDO AJZENBERG
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA

Ao contrário do ano passado, quando trouxe à Bienal de São Paulo um quarteto de nomes consagrados, Portugal optou desta vez por constituir, para a feira do Rio que começa hoje, uma delegação de "novos talentos" literários.
A representação oficial portuguesa, que deve desembarcar hoje no Brasil, é composta por Jacinto Lucas Pires, José Eduardo Agualusa, Luís Filipe Castro Mendes e Clara Pinto Correia.
Com exceção desta última, que apresenta inclusive um programa semanal na televisão, trata-se de nomes ainda pouco conhecidos do chamado grande público até mesmo em Lisboa, o que não significa, desde logo, que não tenham potencial suficiente para superar o atual semi-anonimato.
Autor de um único livro até agora, intitulado "Para Averiguar do seu Grau de Pureza" (coletânea de 13 contos lançada em 1996), Lucas Pires, 23, recusa a idéia de que possa haver um conflito de gerações em literatura.
Diferentemente do que sua idade possa sugerir, não se trata de um autor apegado a ícones como jogos de computador, televisão ou technomusic.
Seu texto é carregado de lirismo, mesmo quando trata de temas como o ciúme, a morte, o suicídio. As referências preferenciais de Lucas Pires estão nos anos 60; o cineasta Jean-Luc Godard é um dos seus ídolos.
"Muitas vezes, autores mais velhos possuem maior atualidade do que outros mais jovens", diz o escritor, que já tem pronta uma peça de teatro, "Universos e Frigoríficos", a ser encenada no segundo semestre de 98.
Angola
A obra de José Eduardo Agualusa, 36, angolano radicado em Lisboa, é marcada pela tentativa de reconstituir em forma de ficção partes importantes da história de Angola.
O último de seus seis livros publicados, "Nação Crioula", lançado em março deste ano, é um romance estruturado com base em cartas e que tem como protagonista um famoso personagem criado por Eça de Queiroz (1845-1900), o aventureiro Carlos Fradique Mendes.
Agualusa transporta esse personagem para um novo mundo ficcional, no qual, por meio da história de uma ex-escrava que se torna rica e ela mesma escravocrata, relata a decadência do tráfico de escravos na segunda metade do século passado e suas consequências em Angola, Brasil e Portugal.
Fã de Jorge Luis Borges, que soube, na sua opinião, "combinar um estilo perfeito com idéias mais perfeitas ainda", Agualusa critica fortemente a atual literatura predominante em Portugal.
"Escreve-se muito bem e bonito, mas sobre o vazio", diz.
Poesia
Único poeta do grupo, diplomata de carreira, Luís Filipe Castro Mendes, 47, identifica-se com a busca de uma poesia comunicativa e voltada em grande parte para as formas clássicas, menos dependente daquilo que ele chama de "gestos de vanguarda" e distante da tendência excessivamente discursiva que predominou na poesia portuguesa por várias décadas a partir dos anos 40.
Vem publicando regularmente quase um livro por ano, desde 91, e se diz temeroso em relação à possibilidade concreta de repetir-se na criação literária.
Afirma Castro Mendes que "o perigo da poesia que faço é o de embalar-se eternamente na música das palavras e perder a capacidade de inovar qualquer coisa".
Multimídia
Clara Pinto Correia é uma profissional do tipo multimídia e multitemático. Aos 37 anos, além de trabalhar para rádio e televisão, tem mais de vinte livros publicados, reunindo crônicas, contos, obras infantis, novelas policiais e romances.
Bióloga, com doutorado em embriologia nos EUA e dezenas de artigos científicos publicados em diferentes revistas especializadas, seu último livro, lançado mês passado, é uma espécie de manual com "verdades e mentiras" sobre a clonagem de animais.
A editora Rocco publicou no Brasil recentemente o romance "Ponto Pé de Flor", obra de maior vendagem produzida por Correia, certamente a menos "novata" dentre as atrações trazidas por Portugal para a Bienal do Rio.

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