São Paulo, sábado, 16 de agosto de 1997
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Para especialistas, opinião pública prejudica a Justiça

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Julgamentos são subjetivos. Dependem da interpretação dada aos fatos e à lei. Por isso, nem sempre as decisões judiciais agradam à opinião pública.
Mas deve essa opinião pública ser levada em conta na hora da decisão? O juiz deve agir como um instrumento de satisfação do sentimento popular? Ou deve ser independente e decidir de acordo com a lei e sua convicção, forjada nas provas reunidas no processo?
Cinco especialistas consultados pela Folha -dois juízes e três advogados- entendem que a interferência da opinião pública no processo de decisão do juiz pode ser perigosa e criar muita injustiça.
Eles lembram também que o Legislativo, quando vota emocionalmente, acaba produzindo leis ruins, como a Lei dos Crimes Hediondos (leia texto abaixo).
A pressão popular torna-se notória nos casos de grande repercussão na mídia.
Aparece como reação ao delito noticiado e na forma mais primitiva e instintiva: o desejo de vingança, de punição ao crime cometido.
"Popularidade não é, nem deve ser, requisito da sentença judicial. No dia em que o Poder Judiciário se curvar a qualquer tipo de pressão, ainda que seja da opinião pública, nós correremos o risco de ver muitas injustiças", alerta Eduardo Muylaert Antunes, advogado criminalista.
Alberto Zacharias Toron, também advogado criminalista, diz que a idéia de fazer justiça está ancorada no bom senso, na lei e na serenidade. Não envolve emoções.
Para ele, o juiz não pode pautar-se pela indiferença nem pela revolta, sob pena de perder a objetividade e tornar-se injusto.
"O juiz tem de ficar a salvo de pressões, sejam elas quais forem. Não pode abrir mão da serenidade. Isso é difícil, mas é quase um pressuposto para ser justo", afirma ele.
Paulo José da Costa, advogado e professor de direito penal, diz que decisão judicial não é para ser aplaudida, nem criticada.
"O juiz deve ser independente e julgar à luz da Constituição e da lei. Se ele interpretar mal a lei, cabe reforma pelo órgão superior. Para isso existem os recursos", diz.
Na opinião de Dyrceu Cintra, presidente da Associação Juízes para a Democracia, o papel do juiz não é exercer a repressão (que deve ser exercida pelos órgãos estatais competentes), mas impor limites a ela.
Ele diz que o direito penal moderno baseia-se mais na responsabilidade pelo ato e não só no resultado que esse ato produziu.
E o direito penal tem dupla função: permite ao Estado punir e oferece ao réu garantias contra abusos na forma de punir.
"O juiz deve ficar no meio das duas lógicas: a da punição e a da garantia. O perigo de atender ao clamor popular é que este só leva em conta a necessidade de punir", afirma Luiz Flávio Gomes, juiz da 26ª Vara Criminal de São Paulo.
Segundo Gomes, os valores que o juiz deve levar em conta ao decidir são: 1) os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição; 2) as leis; 3) a realidade social, os usos e costumes.

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