São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 1997
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Rendimentos: dois pesos e duas medidas

IRINEU THOMÉ

O governo comemora estrondosamente, como um feito de um vetor positivo de grande magnitude que não pode dar margem a quaisquer críticas, o aumento da arrecadação de tributos.
Com efeito, apenas em julho, o Imposto de Renda Pessoa Jurídica teve uma expansão surpreendente de 17,85% sobre o mês anterior. E o crescimento da arrecadação de impostos dos contribuintes de todas as faixas apresenta crescimento constante de 1994 (R$ 64 bilhões) a 1996 (R$ 95 bilhões), um salto de quase 70%. Sem falar na estimativa da própria Receita Federal de que, neste exercício, o valor deve subir para algo em torno de R$ 108 bilhões.
Comemorações estrondosas à parte, elas soam tão sonoras quanto o pesar da constatação de que isso se dá na proporção inversa da capacidade governamental de reprimir os gastos -também sempre crescentes-, apesar do discurso da repressão ao dispêndio dos recursos amealhados junto ao caixa do Tesouro Nacional. O Estado gasta muito mais do que arrecada. Pior: gasta mal, de forma errada.
Na fúria arrecadadora em busca de recursos sempre insuficientes -apesar de a folha de pagamento do funcionalismo estar congelada há dois anos-, afloram alguns conceitos sobre erros crassos na forma da arrecadação, como aquele em que vemos privilegiados os rendimentos do capital em detrimento do rendimento do trabalho.
Vamos ao exemplo mais flagrante que vigora atualmente. Pessoa jurídica tributada pelo lucro real, em 1995, pagava tributos de R$ 4.749.781,30 para cada parcela de R$ 10 milhões de lucro apurado, sendo parte da contribuição social e a maior parcela do Imposto de Renda, numa somatória de 47,5%.
Se distribuído aos sócios o lucro líquido, após as deduções legais, havia tributação na fonte com uma alíquota de 15%, o que correspondia a uma contribuição de mais R$ 787.532,80 aos cofres públicos, elevando a parcela a 55,37% do lucro.
Para o mesmo lucro apurado no ano seguinte, 1996, a empresa pagou 30,31%, uma economia de 17,19 pontos percentuais sobre o lucro, na comparação com 95, ou uma redução de 36,19% sobre a carga tributária do ano anterior.
O lucro líquido distribuído aos sócios ficou isento de tributação na pessoa física, e isso representa uma redução de outros 15% sobre as regras anteriores.
Outra inovação que beneficiou sócios e acionistas foi a dedução, para efeito de apuração do lucro real, dos juros pagos aos mesmos como remuneração do capital próprio.
Estão sujeitos apenas à alíquota de 15% na fonte. Significa que esses rendimentos deixaram de pagar, em 1996, 25% de Imposto de Renda quando comparados à carga tributária de 1995. Isso sem levar em consideração a redução oriunda da isenção sobre o lucro distribuído.
O valor pago a título de juros sobre o capital próprio, a partir de 1997, passou a ser dedutível também para fins de apuração da Contribuição Social Sobre o Lucro, permanecendo tributado pela alíquota única na fonte, de 15%.
É esse o fato que possibilita às empresas distribuir rendimentos a seus sócios acionistas pagando apenas 15% em tributos, dentro das limitações da legislação.
Para as empresas, considerando que a taxa de juros de longo prazo esteve sempre acima dos dez pontos percentuais, pagar a seus sócios juros sobre o capital próprio significa substancial economia de tributos.
De acordo com o exemplo acima, a carga de tributos, da ordem de 55,37% em 1995, fica reduzida a apenas 15% hoje, se o mesmo rendimento for pago a título de juros sobre o capital próprio.
O mais surpreendente é constatar a injustiça flagrante em que o rendimento do capital (juros) paga apenas 15% de Imposto de Renda, enquanto o rendimento do trabalho (salário) está gravado em 25% na fonte mais o acréscimo do INSS.
Vale enfatizar que as empresas beneficiadas por esse tratamento fiscal são aquelas que possuem patrimônio líquido de maior monta, comum às de grande porte, geralmente indústrias detentoras de considerável imobilizado. Empresas menores, basicamente as prestadoras de serviços, embora empreguem substancial parcela da mão-de-obra, normalmente não dispõem de patrimônio líquido significativo e, em consequência, pouco ou nada usufruem dessa prerrogativa fiscal.

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