São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 1997
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De memórias e biscoitos

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - O que se vai ler a seguir não é informação ou análise, mas fruto de "feeling" e de memórias.
Memória 1 - Argentina, 1981. O câmbio estava congelado havia cinco anos. Um belo dia, acabou o fluido do isqueiro, joguei fora e, provisoriamente, comprei uma caixa de fósforos. Era "made in Brazil", mas custava menos do que um produto local.
Dias depois, no supermercado da esquina (e não em uma loja de importados), compramos uma prosaica vassoura. Era "made in USA".
Decretei, no meu íntimo: "País cuja política econômica induz a importar vassouras e caixas de fósforos está condenado ao fracasso".
Foi uma das raras vezes em que acertei na previsão. Não passou um mês e a ditadura trocou de general-presidente e de ministro da Economia e, o novo, tascou uma maxidesvalorização de 30%. A baita confusão posterior exigiria um livro para ser relatada.
Memória 2 - Chile, início dos anos 80. O câmbio também estava congelado há algum tempo. Uma loja de importados no centro de Santiago parecia uma ONU de bugigangas de variada procedência, de torrone italiano a bonequinhos orientais. Decretei de novo, em silêncio: "Um país que importa quinquilharias tão maciçamente e que tem um desemprego na altura dos 30% vai pro vinagre já, já".
E foi. Só depois da correção cambial é que a economia chilena aprumou, embora com custos sociais enormes, mas que não são o tema hoje.
O "feeling" - anúncio da Nestlé, na mais recente "Veja São Paulo", oferece biscoitos importados da Suíça.
Não é produto "high-tech", não é segredo industrial, não é artigo de primeira necessidade, não moderniza a produção nacional.
Será que não há algo errado em uma política econômica que induz uma empresa multinacional, mas com fábricas no país e até marca de fantasia (biscoitos São Luís), a importar bolachas suíças?

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