São Paulo, sexta-feira, 22 de agosto de 1997
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Exagero contamina "Ninguém Falará..."

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Contra as desenfreadas loucuras de ação, o melodrama exagerado, e por isso cruel, da cultura latina.
Esse parece ser o principal -e involuntário- mandamento de "Ninguém Falará de Nós Quando Estivermos Mortos", filme do cineasta espanhol Agustín Díaz Yanes, que estréia hoje.
Díaz, para as chances publicitárias do filme, interessa pouco. "Ninguém Falará de Nós Quando Estivermos Mortos" deveria se valer por sua estrela, a atriz Victoria Abril que, nesse longa-metragem, troca seu eterno papel de sedutora pelo da mulher condenada por uma paixão.
Ela interpreta Glória, uma dona de casa que tem a rotina alterada após um acidente ocorrido com seu marido toureiro, levado ao coma após uma tarde infeliz na arena, quando o touro teve mais sorte que o normal.
Um marido que não sabe mais que ela existe e a transforma em uma alcoólatra.
Glória parte para o México e serve como prostituta de mafiosos locais.
Sua rotina é o mais completo descaminho. Isso dura até o instante em que Abril testemunha uma morte e rouba um importante caderno de notas contendo todos os lugares do mundo onde uma quadrilha realiza "lavagem de dinheiro".
Volta então à Espanha e planeja, com essa oferta do acaso, ser uma outra pessoa.
Tudo isso nos é contado nos primeiros 15 minutos de filme. O resto do tempo será preenchido com o excesso.
Folhetim O que poderia ser uma história policial se converte em folhetim barato. E dos mais sem autocrítica.
Quando Gloria sofre, é sempre até a alma. Quando uma tragédia lhe acontece, terá que ser a pior possível.
Seria essa a cultura espanhola, ou ao menos parte dela? Certamente sim.
Mas isso, em "Ninguém Falará de Nós Quando Estivermos Mortos", desaparece pela incapacidade de seu diretor em perceber que uma história triste não é um meio para leituras políticas ou morais. Algo que deva de alguma maneira estar ligado ao verossímil.
Glória não necessita de um passado ligado à herança franquista -como mostrado no filme- para que possa existir.
Precisa, apenas, de acontecimento fantástico e sombrio, porque é assim um melodrama.
Algo que o diretor Pedro Almodóvar, no longa-metragem "A Flor do Meu Segredo", entendeu de maneira magnífica. Algo que Agustín Díaz Yanes não soube perceber.

Filme: Ninguém Falará de Nós Quando Estivermos Mortos
Produção: Espanha, 1995
Direção: Agustín Díaz Yanes
Com: Victoria Abril, Frederico Luppi, Pilar Barden
Quando: a partir de hoje, no Cinearte 1

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