São Paulo, domingo, 24 de agosto de 1997
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A solução começa no Centro

MARCO ANTONIO RAMOS DE ALMEIDA

A requalificação do Centro não deve ser tratada como sendo mais uma das questões locais da metrópole. Trata-se de uma ação de caráter estratégico, núcleo de uma política global da metrópole.
No caso de São Paulo, seus enormes problemas estruturais podem ser resumidos em dois: a exagerada expansão horizontal -dispersa da mancha urbana sem qualidade e a fragmentação desta em numerosos subsistemas praticamente desconectados e isolados uns dos outros, com fortes descontinuidades em seus padrões de ocupação do solo e de infra-estrutura também descontínua, desigualmente distribuída, obsoleta e escassa.
Uma política urbana que pretenda reestruturar a metrópole, reduzir suas disparidades sociais e torná-la mais eficiente e produtiva deverá valer-se da energia indutora que só um Centro multifuncional e poderoso possui. É também a partir do Centro que se poderá implantar um sistema de espaços públicos de qualidade, pois a área central, historicamente, é a única região da cidade com uma dimensão pública e uma vocação de diversidade cultural e social.
Não se trata de privilegiar uma região, mas de assumir, corajosa e decididamente, a região que é, pelas suas funções, o grande espaço democrático da cidade.
Não significa que São Paulo deva ter apenas o Centro histórico requalificado. Pelo contrário. São Paulo apresenta, como as demais metrópoles modernas, novas centralidades monofuncionais (não raro, de caráter fortemente especulativo), às quais um marketing enganoso atribui papel de "novo Centro", em clara oposição ao Centro metropolitano.
Disso decorre uma política urbana equivocada, que consiste em alocar vultosos recursos públicos para levar uma infra-estrutura caríssima a regiões preponderantemente privadas, com remoto significado econômico (porque são essencialmente ligadas a interesses econômicos específicos), baixa densidade cívica (nada representam culturalmente) e escasso desempenho social (pela falta de relação com setores vizinhos).
Um pensamento que considere a integridade de um organismo metropolitano como São Paulo deve contemplar a existência de centralidades reais, vivas, multifuncionais, que se articulem com o Centro. Teriam a função de conter a expansão dispersiva da mancha urbana, redirecionando-a "para dentro" e estimulando o adensamento nos espaços subutilizados.
Matéria na Folha do dia 17 de agosto revelou que as áreas centrais se despovoam enquanto as periferias pobres experimentam uma explosão demográfica. A área central é um "buraco negro" que exerce uma pressão "para fora" -empurrando os mais pobres para as periferias lotadas e os mais prósperos para os condomínios fechados, também periféricos.
O que se assiste hoje é a "periferização" do Centro e o adensamento das periferias pobres em sua pior forma. A recuperação do Centro, portanto, está na raiz de uma nova política urbana, que articule de forma efetiva e democrática a metrópole.

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