São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 1997
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A hora de subtrair

ELIO GASPARI

Há um mistério na luta interna dentro do PT. Quem está tirando proveito de quem? À primeira vista, o Partido dos Trabalhadores é uma organização de bases sindicais, com alguma simpatia da classe média, contaminada por grupelhos esquerdistas que lhe tolhem os movimentos. E se não for isso, mas exatamente o contrário? Se o PT for uma organização ferida nas bases sindicais que a cada dia tem menos simpatia na classe média e vive de aplicações de emplastros radicais?
Admitindo-se que o PT moderado, capaz de produzir uma alternativa de poder à coligação governista, gravite em torno de Lula, Tarso Genro, Vicentinho e alguns parlamentares de sua bancada federal, o que é que ele produziu nos últimos tempos?
A aposentadoria especial de Lula como perseguido político, o escândalo da Cpem e o apoio da CUT ao fim da contagem de tempo de serviço para efeitos de aposentadoria. Isso no campo das atividades. No campo da inatividade, produziu um abissal silêncio em relação às políticas públicas de saúde, educação e segurança. Aqui e ali há exceções, mas essa é a regra.
Essa mesma ala moderada só saiu do estado de catatonia quando marchou a reboque daquilo que se denomina ala radical. Assim foi em abril, quando as bandeiras vermelhas do PT saíram do armário para engrossar a marcha dos sem-terra sobre Brasília. Assim foi em todas as greves de professores e médicos. E assim foi até no caso da baderna dos PMs, cuja mola propulsora estava mais para bandidagem do que para trotskismo. (O presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Ceará, condenado por homicídio, talvez acredite que trotskismo é uma modalidade de esporte hípico.)
Quando Lula disse que a fome dos policiais mal pagos é mais importante que a hierarquia, demonstrou sua incapacidade de se dissociar do radicalismo que parece dar certo, entendendo-se que dá certo tudo aquilo que consegue botar gente na rua, inclusive fila de cinema.
Esse pedaço do PT vive uma profunda crise de identidade. Lula chega a elogiar o primeiro-ministro inglês, Tony Blair, mas é incapaz de praticar os gestos elementares que o levaram a reorganizar o Partido Trabalhista. Blair não tem negócio com as atividades dos socialistas, mesmo quando eles têm alguns milhares de pessoas atrás de suas bandeiras. Pior: Blair não tem negócio com professores que não dão aulas e médicos que não vão ao hospital.
Se a ala moderada pega carona nas marchas e mobilizações da corrente mais à esquerda, esse outro pedaço do PT, mesmo sabendo o que quer, suspeita que isso não lhe dê votos. Precisa do adversário para parecer maior do que é. Essa soma de aparências chegou ao limite com a disputa entre José Dirceu e o deputado Milton Temer pela presidência do partido.
Oferece-se ao distinto público uma simplificação na qual Dirceu é um moderado e Temer é um radical. Será que alguém acredita nisso? Nem Dirceu é moderado nem Temer é um radical. Uma falsa disputa produziu uma competição de estereótipos ocasionais.
O melhor que pode acontecer ao PT é uma cisão. Desde que o governador Vitor Buaiz o abandonou, fixou-se a idéia de que a melhor maneira de perder tempo é querer negociar qualquer coisa com um partido incapaz de resolver para onde vai. Rachado, produzirá um bloco esquerdista sincero, que dificilmente elegerá meia dúzia de deputados federais e estaduais. Ele terá algum trabalho para se diferenciar do PC do B, mas poderá viver em espaço próprio. Do outro lado, resultará um bloco capaz de incorporar ao seu projeto alguns pedaços da plataforma tucana. Terá trabalho para se diferenciar do PSDB.
A crise do PT pode produzir o fim do método matemático de se fazer oposição. Ele ensina a somar quantidades diferentes, supondo que ao fim da conta, no Planalto, acertam-se as diferenças. Desde que FFHH levou isso ao extremo, pulando para o colo do PFL, essa matemática tem dono.

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