São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 1997
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Hamas rejeita trégua pedida por Arafat

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL*

O Hamas (Movimento de Resistência Islâmico) recusou ontem o apelo da ANP (Autoridade Nacional Palestina) para suspender as ações armadas contra Israel.
"A jihad (guerra santa) é uma escolha estratégica e uma forte linha de defesa para o povo palestino", diz comunicado emitido pelo movimento.
É uma resposta a apelo feito na segunda-feira pela ANP para que os grupos que se opõem ao processo de paz com Israel usassem apenas "meios democráticos e pacíficos e não ataques militares", conforme disse Taieb Abdel Rakim, porta-voz da ANP.
A recusa do Hamas acaba colocando esse grupo extremista, teoricamente marginal politicamente, no centro do confronto entre Israel e os palestinos.
Tanto é assim que o premiê israelense, Binyamin Netanyahu, disse, em visita a Tóquio, que o encontro de anteontem entre Iasser Arafat, o líder da ANP, e Abdul Aziz Rantisi, dirigente do Hamas, pode ter sido "o beijo da morte" no processo de paz.
Netanyahu, que vem pedindo a Arafat o desmantelamento da estrutura terrorista, encara o encontro entre os dois como "um compromisso com o terrorismo", exatamente o inverso do que o premiê israelense exige.
A reação do Hamas ao pedido da ANP parece refletir o fortalecimento do grupo como consequência direta do bloqueio que Israel impôs aos territórios palestinos, após atentado a um mercado de Jerusalém, no qual morreram 16 pessoas (inclusive os dois terroristas), no dia 30 passado.
No lugar de Israel e da ANP
A rede assistencial do Hamas está, na prática, substituindo tanto Israel como a ANP. O grupo distribui alimentos e pequenas quantias em dinheiro para as famílias cujos chefes estão impedidos de trabalhar em Israel.
Fornece ainda tratamento médico grátis em suas clínicas e até acampamentos no litoral, nos quais mistura lazer com fortes doses de doutrinação islâmica.
O fortalecimento do Hamas só tende a continuar, agora que a agência da ONU para refugiados, por falta de recursos, decidiu cobrar uma anuidade (equivalente a US$ 14) dos 188 mil alunos a que atende em 267 escolas da faixa de Gaza e da Cisjordânia, territórios predominantemente habitados por palestinos.
Ontem, houve um protesto de dezenas de palestinos contra a decisão, justificada pela lentidão no envio de recursos pelos países que doam verbas para a ANP.
Com isso, a rede de ensino do Hamas passa a ser uma alternativa ainda mais valiosa para os que não puderem pagar nem os US$ 14 que a ONU resolveu cobrar.
Para fechar o círculo, a ANP anunciou que seu déficit orçamentário, este ano, será de cerca de US$ 400 milhões, oito vezes mais do que o inicialmente previsto.
Consequência: "A ANP não poderá oferecer os serviços necessários, mesmo que Israel pague o que nos deve", diz o ministro palestino de Economia e Comércio, Maher Masri.
Israel bloqueou também a transferência para a ANP dos impostos que arrecada, mas pertencem aos palestinos, nos termos do acordo de paz.
Nesse vácuo, entra a rede do Hamas, o que dá lógica a uma afirmação de seu líder, Aziz Rantisi, que, em outro momento, soaria como bravata: "A cada dia, o apoio a nosso movimento está ficando mais forte".
Talvez por isso, o Hamas sinta-se em condições de rejeitar o apelo à moderação da ANP, à qual contrapropôs a libertação de todos os seus cerca de 150 prisioneiros. A ANP negou, na certeza de que, se concordasse, seria de fato "o beijo da morte" no processo de paz.

*Com agências internacionais

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